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Meu Irmão E Eu
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— Não. Na cama, não. Baixe as calças e encoste-se à parede. Eu vou comer você em pé — ordenou, com os lábios colados em meu ouvido.

E, logo, penetrou-me. Estava pressionado contra minha estante de livros, e ele a me invadir com força. Era violento, mas eu gostava. Uma de suas mãos chegou ao meu membro, e senti que estava sendo masturbado, enquanto a outra encontrou minha língua. Então, ele disse, com tom de ordem:

— Chupe meu dedo.

Ele falava palavras quentes. O movimento dos seus quadris me extasiava! Não demorou e ele me inundou, derramando-se dentro de mim e gemendo em minha nuca. Eu o acompanhei, banhando o chão do meu quarto. Meu corpo relaxou depois que gozei. Ele, ainda dentro de mim, pôs-se a se movimentar novamente. O quê? De novo? Pensei. Franzi a testa e olhei para ele.

— Relaxa, garoto. A segunda é bem melhor. Já tá tudo molhadinho.

Na mesma hora, arfei. Suas mãos suadas apertaram minha cintura com força, e o movimento era rápido e brutal. Recostei minha cabeça para trás e minha nuca encontrou seus lábios.

— Fique de quatro na cama — ordenou.

Apoiei meus braços esticados sobre os travesseiros e ele se pôs de joelhos atrás de mim. Levou suas mãos aos meus ombros e me pressionava contra seu membro com força. Não demorou muito e eu o senti, de novo, gozando dentro de mim. E, mais uma vez, derreou seu corpo cansado sobre o meu.

Na sala de estar, todos apreciavam o foie gras, quando Pablo e eu descemos as escadas. Foi impossível não perceber a testa franzida de Aidan. O que será que ele está pensando? Papai conversava com Núbia e Marcus, e Pablo logo foi ao encontro de Juan. Aidan estava sozinho. Fui até ele.

— Oi — falei, baixinho.

— Oi. Pablo estava com você? — perguntou-me.

— Sim. Ele queria usar o banheiro, então mostrei onde ficava. Foi só isso.

Ele deslizou a mão em minha cintura e abraçou meu corpo, discretamente. Perguntou se ele e eu estávamos bem. Respondi que sim e afastei meu corpo do dele. Seu hálito tinha cheiro de álcool. Ele está bêbado! Então, pedi para ele não beber mais e tentar convencer papai a descansar.

— Meu amor, estamos todos cansados. Acho que devíamos encerrar. Papai não pode beber em excesso.

Seus olhos brilharam. O sorriso ficou radiante. Não parava de me olhar com cara de bobo apaixonado.

— Você sabe que foi a primeira vez que me chamou de “meu amor”?

— Foi? — perguntei, com meio sorriso nos lábios, não percebendo o que tinha dito.

— Foi sim! O que você quer que eu faça?

— Aidan, estamos todos cansados. Acho que devemos parar por aqui. Papai precisa dormir.

No mesmo instante, ele largou o copo e se dirigiu à cozinha. O que ele está fazendo? Pensei. Retornou para perto de mim e puxou-me pelo braço até papai.

— Senhor Barrys, com licença. Quero dizer ao Senhor que estou muito feliz de passar meu Natal com sua família. E aproveito para pedir ao Senhor...

Na mesma hora meu coração estalou. Não acredito no que eu estou ouvindo. Oh, meu Deus! Foi quando Marcus tomou a voz dele, interrompendo-o:

— Papai, Aidan quer pedir ao Senhor para dormir aqui, hoje. Ele bebeu demais e não quer dormir sozinho. Disse a ele que o Senhor não iria se opor.

— Mas claro que não, filho. Você pode ficar na nossa casa o tempo que quiser. Núbia, por favor, mande preparar um quarto para ele.

Meu coração voltou a bater. Que susto tive. Aproximei-me de papai e tirei o copo de uísque de sua mão. Dizia a ele que era hora de encerrar a festa, quando Emmanuelle avisou a Aidan que o táxi tinha chegado. Táxi? Que táxi? Aidan foi até Juan e Pablo e cochichou algo para eles, dando-lhes tapinhas nas costas. Os irmãos mexicanos aproximaram-se e agradeceram o convite para estarem conosco. Pablo me olhava com a cara feia, parecia estar com raiva, mas disfarçadamente apertou minha mão e se despediu. Por que ele está com raiva? Ele já fez sexo comigo. O que mais ele quer? Pensei. Depois que eles saíram, mandei desligar a música e recolher as bebidas. Já tivemos emoção demais por hoje.

— Hora de todos irem para a cama! — exclamei, beijando papai e meu irmão, e desejando boa-noite a todos.

A água que escorria do meu corpo levava consigo o cansaço do dia e me deixava a sensação de tranquilidade e paz. Naquela noite, depois de todas as emoções que vivi, somente o silêncio e a solidão do meu quarto seriam capazes de oferecer quietude ao meu coração. Depois de escovar os dentes e secar o cabelo, vesti meu calção de pijama preto. A maciez do seu tecido dava-me a sensação de não estar vestindo nada, e aquilo era relaxante. Estava com sono. Apaguei as luzes e me deitei por cima das cobertas. Recostei minha cabeça, quando vi sobre a mesinha do abajur, ao lado da cama, a tulipa que Marcus me trouxe pela manhã. Apertei meus olhos, com meio sorriso nos lábios, e me lembrei dele. Tomei-a à mão e levei-a à minha narina na esperança de sentir algum aroma. Fechei meus olhos e, em prece, dirigi-me a Deus:

“Senhor, obrigado por este dia que me destes. Obrigado pela minha família e, principalmente, pelo meu irmão Marcus. Perdoa-me, se o ofendi hoje. E peço que cuides da minha vida, assim como cuidou da vida do seu filho Jesus. Peço também que receba minha mãe junto do seu Reino. Jesus, parabéns pelo seu aniversário. Amém.”

Os meus olhos se abriram, e eu o vi. Era Aidan. Estava à porta do meu quarto, parado. Sentei-me na cama e disse baixinho:

— Aidan, é melhor você ir dormir.

Ele encostou a porta e caminhou devagar em minha direção. Agachou-se e deixou seu rosto na altura do meu. Olhava-me fixamente, quando me disse, com a voz serena:

— Eu não quero nada. Só vim dormir abraçado com você. Prometo. É só isso — e me beijou castamente os lábios, fazendo aquela cara de apaixonado.

Como resistir? Pensei.

— Você bebeu demais hoje. Tomara que não ronque, pois estou com sono e quero dormir — falei, fazendo voz de bravo, mas sorrindo e levantando as cobertas para ele entrar.

Ele apertou os olhos sorrindo e, logo, encostou seu corpo no meu. Puxou-me para deitar em seu peito e, enquanto me acarinhava as costas, perguntou:

— E essa flor?

— Foi meu irmão que me deu de Natal. Ela vai dormir conosco — e levei meus lábios aos dele e o beijei, desejando-lhe uma boa-noite.

— Boa noite! Eu amo você — respondeu, puxando meu corpo para si novamente.

Então, adormecemos. O peito de Aidan me serviu de travesseiro a noite toda. Estar ao seu lado, sentir seu cheiro, tocar aquele corpo rígido me fez lembrar aqueles dias em que estivemos juntos em Nova Iorque.

Abri meus olhos com o corpo descansado e com a sensação de bem-estar. Ele movia seus dedos por minhas costas de cima para baixo. Ele já acordou? Era tão gostoso estar ali em seus braços, sob seus carinhos. Estava me sentindo amado. E aquilo era muito, muito bom.

— Já acordou? — perguntei baixinho.

— Sim. Quase não dormi — respondeu, ainda de olhos fechados.

— Por quê?

— Porque estou muito feliz de estar aqui com você.

Ele tomou meu cabelo em sua mão e pressionou meu rosto contra o dele até seus lábios tocarem os meus, e disse:

— Bom dia, meu amor! — enquanto dava-me beijinhos singelos.

— Bom dia! — respondi.

Sua mão voltou a acarinhar minhas costas. Eu encaixei minha coxa sobre a dele e lhe acarinhava o peito com a ponta dos dedos, quando senti a primeira contração. Eu estava molhado e excitado. Não me contive e levei minha mão ao seu membro. Estava alto, latejando. Aidan retorceu a cabeça para trás e gemeu. Encostei meu rosto no dele, beijei-o, e perguntei:

— Posso fazer uma coisa?

Ele me olhou com meio sorriso nos lábios e disse que sim. Seus olhos estavam curiosos, quando sussurrei em seu ouvido que eu nunca havia feito, mas que tinha vontade. E fez cara de pensativo quando joguei as cobertas ao chão e subi em seu abdome. Tirei sua camisa e deixei seu peito à mostra. Levei meus lábios aos seus e fui deixando uma trilha de beijinhos do peito ao umbigo. Olhei para ele e desabotoei a bermuda, tirando-a e contemplando suas pernas peludas. Afastei-me e me pus a apreciar seu corpo com os olhos, dos pés ao rosto. Encantei-me. Somente de cueca, ele estava diabolicamente sexy na minha cama. Levemente, baixei a Prada branca e pus minha boca no membro dele. Eu estava preenchido. Que sabor! Os gemidos dele me causavam excitação. Salivei minha mão e me masturbei, enquanto ele fazia movimentos suaves com o quadril e acarinhava meu rosto com as costas dos dedos. Ele estocava minha boca devagar, quando minha língua encontrou o primeiro jato. Ele está jorrando na minha boca. Seu último gemido foi acompanhado da última contração do orgasmo. Que coisa maravilhosa. Acho que vou querer fazer isso de novo. Eu ainda tinha o gosto do seu membro na boca, quando ele me puxou para si e me beijou. Sua língua passeava entre meus dentes à busca daquele sabor, quando uma corrente de vento chegou ao meu corpo. Larguei a boca de Aidan e abri os olhos. A porta do quarto estava aberta. E minha pupila dilatou, quando vi papai olhando para nós. Oh, meu Deus! Eu não acredito! Papai viu tudo! Agora estou fodido! Pensei.

***

CAPÍTULO DOIS

Duas surras

__________________

Era o dia do aniversário de mamãe. Antes mesmo que a babá nos acordasse, papai foi ao meu quarto e explicou que Marcus, ele e eu iríamos fazer uma surpresa para ela no fim da tarde. E pediu para fingirmos que esquecemos a data. Naquele dia, quando meu irmão e eu retornamos do colégio, papai nos esperava na sala. Vendo-nos, disse a meu irmão que fosse tomar banho, e pediu à babá para acompanhá-lo. Segurou minha mão e levou-me ao meu quarto. Ele tinha a cara fechada, parecia estar com raiva. Enquanto trancava a porta a chaves, mandou-me sentar na cama, dizendo que precisava falar comigo. Obedeci-o. Ele arrastou uma cadeira e sentou-se diante de mim.

— Gaius, hoje fui chamado no seu colégio. Você sabe por quê?

Balancei a cabeça, dizendo que não.

— O diretor me chamou porque os pais de um dos seus colegas, o Jean, fizeram uma reclamação contra você. Sabe o que eles disseram?

Novamente, balancei a cabeça, reafirmando que não.

— Disseram que Jean contou que vocês dois estavam brincando no banheiro do colégio. O que vocês faziam lá, meu filho?

— Papai, nós tiramos a roupa e eu fiquei pegando no pinto dele — respondi, envergonhado.

— E por que fez isso?

— Ele contou que viu sua mãe pegando no pinto do pai dele, e pediu para eu fazer a mesma coisa no dele. Então, nós tiramos a roupa e eu fiz. Era uma brincadeira.

— Gaius, o que fez não foi certo. Um homem não pode pegar no pênis de outro. Isso é pecado! Deus não gosta! O que o diretor me relatou não foi isso. Afirmou que os pais de Jean disseram que foi você que teve a ideia de ir para o banheiro. Por que está mentindo para mim? — perguntou, assumindo uma voz agressiva.

— Papai, não estou mentindo. Foi Jean quem me pediu — respondi, assustado.

Nisso, percebi o olhar de desconfiança dele. Papai não acreditou no que disse. E depois de explicar-me mais uma vez que eu estava errado, mandou-me tirar a calça. Obedeci-o, mesmo sabendo que seria castigado. Meus olhos estavam marejados, quando pedi para ele não me bater. Então, ele engrossou a voz e me ordenou que o obedecesse, enquanto se levantou e tirou o cinto das calças. O pavor se apossou de mim. Minhas mãos tremiam e eu já chorava, quase descontroladamente. Exaltado, gritou, mandando-me parar de chorar.

— Cale a boca! Homem não chora! Vai ser castigado para nunca mais fazer isso! Baixe a calça, agora! — ordenou, gritando, com fúria na voz.

Atendi sua ordem e me virei de costas para ele. Papai me empurrou na cama, e mandou que ficasse deitado e não me movesse nem gritasse, pois, se eu desobedecesse, bateria muito mais. Levei minhas duas mãos à boca e pressionei meus lábios com força. Papai deu-me dez golpes nas nádegas com o cinto, fortemente, que me deixaram marcas e me arrancaram sangue. Em seguida, levantou-me, virou-me de frente para ele, olhou em meus olhos e comunicou-me que aquele castigo era para eu aprender a ser homem. Proibiu-me de contar a qualquer pessoa o que ele fez e me mandou parar de chorar, tomar banho e vestir uma roupa, pois iríamos dar os parabéns à mamãe. Obedeci-o. Quando isso aconteceu, eu tinha seis anos, e minha mãe morreu sem nunca saber da primeira surra que papai me deu.

Em um clarão, vendo papai parado na porta do meu quarto, olhando para mim e Aidan, quase senti a dor dos golpes que ele me deu quando tinha seis anos. Estava estático e o pavor paralisou minha boca. Meus olhos não conseguiam desviar-se dos dele, mesmo quando Aidan tomou as cobertas e cobriu-se. Papai levou a mão à maçaneta e baixou a cabeça, enquanto fechava a porta, deixando-nos sozinhos no quarto. Saiu e não disse nada. Desesperei-me. Meu Deus! Meu Deus! Como isso foi acontecer?

— Aidan, você não fechou a porta? Você não fechou a porta? — gritava.

— Ei, calma! Calma! Vou conversar com ele — dizia, repetidas vezes, tentando me acalmar.

— Não sabe o que está dizendo? Você não conhece papai! Ele nunca vai aceitar isso! Isso não era para ter acontecido assim. Meu Deus, o que faço? — e chorava, desesperado.

— Acalme-se, Gaius! Precisa ficar calmo. Você não está sozinho nisso. Vou conversar com ele. É a nossa chance de ficarmos juntos — dizia, abraçando-me, tentando me tranquilizar.

Mandei Aidan chamar meu irmão, e que ficasse no hotel e não falasse com papai. Ele vestiu-se, pediu que eu me acalmasse e beijou minhas lágrimas, dizendo que me amava e que eu não estava sozinho. Quando saiu do quarto, atirei-me na cama e chorei. Recordo-me do pavor e da angústia que senti em meu peito naquele momento. Nunca havia experimentado algo parecido em toda a minha vida. Meu coração ficou miúdo, e eu, possuído de medo, quando vi a maçaneta da porta do meu quarto se mover. Lentamente, uma mão a empurrava. Vi um homem de barba, e suas roupas eram brancas. Ele carregava em seu rosto a seriedade e, na mão, uma bengala. Era papai. Oh, meu Deus! O que ele vai fazer? Olhava-me, enquanto fechava a porta do quarto a chaves. Depois, caminhou em minha direção. Nisso, senti meu coração acelerar.

— Papai, Marcus e eu íamos conversar com o Senhor. Sinto muito que as coisas tenham acontecido desse jeito. Só quero que saiba que...

Enquanto eu tentava explicar, ele levantou a bengala, agarrou-a na ponta e golpeou meu maxilar com o cabo. Caí da cama e, junto ao gosto de sangue, senti que um dente tinha quebrado. Comecei a gritar, chamando meu irmão e pedindo socorro. Ele golpeou minhas costelas. Fiquei paralisado. Não consegui me mover. Apenas gritava. Ainda ao chão, acertou meu joelho, e depois a coxa, o tornozelo, o punho, o peito, o quadril, o ombro e, novamente, o maxilar. Não conseguia parar de gritar e pedia pelo amor de Deus para que parasse. Então, ele pôs-se a encarar meus olhos. Vi fogo em seu olhar. Era ira. Meu Deus! Ele vai me matar! Agachou-se, aproximando-se mais do meu rosto, encarando-me. Então, eu disse, chorando:

— Papai, por favor, por favor — suplicava.

— Você quer servir de mulher para os homens, é? Então, vou lhe mostrar como é — respondeu, com a voz cheia de raiva.

Papai me virou de bruços e baixou meu calção, abriu minhas pernas e enfiou a ponta da bengala no meu ânus. Gritei.

— Então, está bom assim? Você quer mais, sua mulherzinha? Não é disso que você gosta? — perguntava, quando enfiou de novo.

Ele socava meu ânus com a bengala, quando Marcus bateu na porta, mandando que eu abrisse.

— Gaius! Gaius! Abra a porta! Papai! Papai! Abram a porta! — gritava ele.

— Socorro! — respondia, repetidamente.

Papai tirou a bengala de mim e me olhou nos olhos, cuspiu em minha cara e disse que eu não era mais o filho dele e, ainda, que tinha nojo de mim. Caminhou até a porta e a abriu. Eu estava tomado de dores, mas ouvi o que ele disse a meu irmão:

— Tire esse lixo da minha casa, agora.

As imagens eram embaçadas. Ao longe, ouvia vozes, mas não conseguia compreender o que diziam. Um vulto branco se movimentava diante de mim. O que é isso? Onde estou? Eu morri? Lentamente, abri os olhos e recobrei a consciência. Estava no hospital, e uma mulher negra chamou meu nome.

— Oi, Gaius. Consegue me ouvir? — perguntou, sorridente.

— Quem é você? — respondi.

Era a Dra. Lorena. Depois de dar-me água para beber, disse que eu estava no Center Hospitalier Princesse Grace, em Mônaco, e perguntou se me sentia bem. Depois, ainda, que eu tinha dormido por dois dias seguidos e, também, que havia feito uma pequena cirurgia na boca. Recomendava-me passar alguns dias sem fazer grandes movimentos, quando a interrompi.

— Onde está o meu irmão? — perguntei, ainda meio zonzo.

— Vou chamá-lo — respondeu, deixando-me sozinho no quarto.

Marcus abriu a porta do quarto, e seus olhos encontraram os meus. Chorou, enquanto caminhava em minha direção. Tomou minha mão, beijou-a e falou que sentia muito pelo que tinha acontecido. Avisou-me que Emmanuelle encontrou uma garrafa de uísque no quarto de papai na manhã seguinte à surra, e que, provavelmente, ele tinha passado a noite inteira bebendo. Contou-me que depois do ocorrido, papai saiu de casa e até aquele dia não sabia notícias dele. A voz do meu irmão era trêmula, ele não conseguia parar de chorar. Olhava-me com compaixão. Ouvia-o em silêncio e cheio de dores. Uma lágrima me escapou dos olhos, quando falei:

— Se você não tivesse chegado, ele iria me matar — e solucei.

Ele encostou sua testa na minha, disse-me que assim que saísse do hospital, iríamos para Manhattan, e que eu moraria com ele, Núbia e Arthur. Perguntou como estava me sentindo e me explicou os procedimentos médicos que foram necessários serem feitos em mim nos dias em que estive dormindo.

— Maninho, escute bem o que vou dizer. Você estava sedado por causa das dores e precisou fazer uma cirurgia na boca. Seu maxilar foi deslocado e você perdeu dois dentes. Mas o médico disse que pode fazer implante. Não precisa se preocupar com isso. Sua costela foi fraturada, por isso esta faixa na cintura. E, ainda, teve uma pequena hemorragia anal, mas já foi controlada. Agora, não corre nenhum risco de morrer. O que preciso que saiba é que está tudo bem, e que não vai ter nenhuma sequela grave do que aconteceu. Entendeu? — perguntou-me, aos soluços.

— Tudo bem. Quando vou poder sair daqui?

— A médica disse que mais alguns dias. Dependendo da sua recuperação, até o ano-novo nós viajamos. Daqui do hospital iremos direto para Nova Iorque.

— Onde está Aidan? — perguntei.

— Liguei para ele e contei o que tinha acontecido. Ele queria vir aqui, mas não deixei. Expliquei que você estava sedado e que não sabia quando iria acordar. E, também, que não era prudente ele ficar em Monte Carlo, e terminei pedindo para ele voltar para Nova Iorque, tentando evitar que encontrasse papai aqui. Prometi que ligaria todos os dias para dar notícias suas. Hoje, já falei com ele, mas se quiser eu posso ligar para dizer que você acordou. Ele está muito preocupado e avisou que vai nos visitar, quando chegarmos em Manhattan. Pediu-me para quando você acordar dizer que o ama e que sente muito pelo que aconteceu.

Uma lágrima escapou-me. O sorriso da Dra. Lorena foi a primeira visão que tive naquele dia. Era véspera de ano-novo e ela estava me dando alta. Marcus, Núbia e Arthur estavam empolgados ao me darem a boa notícia. A médica deu-me algumas recomendações, entre elas, que eu refizesse os exames em quinze dias. Do hospital, nós fomos direto ao Aeroporto Côte d'Azur, onde um jatinho particular nos aguardava. Foram quase dez horas de voo direto. Fiquei exausto.

— Ei, maninho. Acorde. Nós chegamos — disse meu irmão, enquanto eu abria os olhos.

Ao descer do avião, dois carros pretos nos aguardavam próximos à pista de pouso do aeroporto de Nova Iorque. Meu irmão pedia aos motoristas que retirassem nossa bagagem do avião, quando Núbia me ajudou a sentar no banco de trás de um dos carros, deixando-me sozinho logo em seguida. A outra porta do carro onde estava se abriu e um homem sentou-se ao meu lado. Era Aidan. Seus olhos estavam marejados e os lábios tremiam, num esforço de não deixar escapar um soluço. Olhei-o, cobri meu rosto com as mãos e chorei. Ele se aproximou, beijou-me a têmpora e levou minha cabeça ao seu peito.

— Não se preocupe. Vai ficar tudo bem. Nós vamos para casa — sussurrou ele ao meu ouvido, confortando-me.

O relógio marcava 22h13, quando entrei no meu quarto. Aidan carregava uma de minhas malas e a acomodou ao lado da cama, agradecendo ao motorista por tê-lo ajudado com as outras. Núbia e Marcus estavam na porta, olhando-me, quando sentei na cama e deslizei minhas mãos sobre os joelhos. Ela sorriu com a boca fechada e puxou o braço do meu irmão, encostando a porta. Fiquei sozinho com Aidan. E era impossível evitar as lágrimas que molhavam minhas coxas. Ele agachou-se e levantou minha cabeça até encontrar meus olhos.

— Você não sabe como eu sinto por tudo que aconteceu — expressou, com a boca trêmula.

— Aidan, muito obrigado por ter me acompanhado. Agora eu quero dormir um pouco. Estou muito cansado da viagem.

— Vou dormir aqui hoje com você.

— Não. Você vai dormir na sua casa. Preciso de um tempo para pensar em tudo que aconteceu. Preciso ficar sozinho. Entende isso?

— Mas não vou incomodar você. Só quero ficar aqui...

— Não, Aidan! Preciso ficar sozinho. Isso não tem nada a ver com você, e sim comigo. Por favor, vá para casa.

Ele me beijou os cabelos e saiu do quarto, fechando a porta, enquanto me olhava, demonstrando a vontade que carregava em ficar comigo naquele momento. Deitei e dormi. Meus olhos se abriram, quando um toque avisava que tinha uma nova mensagem no celular:

“Sei que as coisas estão difíceis agora, mas acredito que tudo vai passar. Não esqueça de mim. Espero por você. Amo você! Feliz ano-novo! Aidan”.

Os dias que se seguiram àquele eram longos, silenciosos e vazios. Em meu peito, carregava a sensação do nada. E a vida parecia não ter graça nenhuma. O frio que desaparecia de Manhattan dia após dia levava as lágrimas do meu rosto consigo, mas não as dores que sentia em minha alma. Era difícil aceitar o que papai tinha feito comigo. Como não lembrar de seu olhar de ira, da cusparada na cara, do que disse de mim, daquela bengala? Ao tentar dormir, ainda tinha lampejos de um homem de branco com uma bengala na mão, caminhando em minha direção. Quantas vezes acordei sobressaltado durante a noite? Quase sempre, mais de uma vez. Era um tormento. Quase três meses passaram-se e pouca coisa havia mudado dentro de mim. Mas tomei consciência de que precisava fazer alguma coisa para sair da situação em que estava. E aproveitei que a primavera deu as caras em Nova Iorque para passear pela cidade.

Era uma manhã de sábado, quando Richard e eu marcamos de nos encontrar no Central Park no fim da tarde. Havia tempos que não o via e pensei que fosse bom retomar minhas amizades. O que não sabia é que ele não me encontraria sozinho.

— Oi! Gaius! Aqui! — acenava ele, quando me viu tomando um cappuccino.

Nesse momento, vi-o. Era Pablo. Caminhava com Richard em minha direção. Meus olhos arregalaram! Será que ele contou ao Richard que nós transamos?

— Oi, amigo! — disse eu, abraçando Richard, meio temeroso.

— Você lembra de Pablo, não? Ele esteve na sua festa de aniversário ano passado.

Graças a Deus que ele não sabe de nada. Pensei.

— Lembro sim. Como vai, Pablo? — perguntei, com a voz tímida, quase não olhando em seus olhos.

Pablo sorriu com a boca fechada e disse que eu estava muito bonito. Enrubesci e sorri.

— Obrigado!

Nós andávamos pelo Central Park, enquanto falávamos amenidades. Richard me contava que terminaria o curso de moda no fim daquele ano e que pretendia passar alguns meses na Itália, logo em seguida. Pablo escutava nossa conversa e tentava nos deixar à vontade. Parecia entender que Richard e eu tínhamos assuntos atrasados, então transformou-se em uma companhia silenciosa naquele primeiro momento. Algumas vezes, surpreendi-o olhando para mim. Aqueles mesmos olhos pretos e sedentos que encontraram os meus no meu quarto em Monte Carlo. Vire-se! Vou comer você em pé! Lembrei, desconcentrando-me do que Richard dizia. Em outro momento, Pablo sugeriu que fôssemos comer alguma coisa, e enfatizou estar faminto.

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