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Meu Irmão E Eu
Chegando à piscina, vi meu irmão ao celular. Estendi o protetor diante dele e sentei-me de costas. Marcus falava sobre negócios, enquanto espalhava o protetor solar primeiro em meus ombros, depois no meio das costas, e, por último, já perto das nádegas. Que mãos fortes têm o meu irmão! Pensei. Dei um tchauzinho a ele e mergulhei. Havia poucas pessoas na piscina, talvez três ou quatro casais, mais dois homens e algumas crianças. A água estava morna, e eu nadava de uma ponta a outra, quando uma câimbra me paralisou.
— Não acredito! Ai que dor, meu Deus! Está doendo demais! — exclamei.
A dor era insuportável, e eu fiquei paralisado no meio da piscina na esperança de ela me deixar. Mas não passava e eu fazia cara feia, quando vi que dois homens me olhavam, curiosos.
— Oi! Você está bem? — perguntou-me um homem de olhos pretos.
Como não respondi, eles foram em minha direção.
— Oi! O que você tem? — perguntou-me outro homem, mais jovem que o primeiro, e com a pele queimada pelo sol.
— É que minha perna está doendo. Acho que é uma câimbra.
— Vamos tirar você da água, certo? — disse o primeiro homem.
Eles encaixaram seus ombros sobre meus braços abertos, um de cada lado, ajudando-me a sair da piscina. O homem de olhos pretos segurou-me nos braços e me levava em direção às cadeiras de sol, quando Aidan avistou-nos de longe e correu ao nosso encontro.
— O que houve? O que você tem? — perguntou, ansioso.
— Não foi nada. Ele só teve uma câimbra — respondeu calmamente o homem que me carregava, enquanto me deitava na cadeira.
De costas para mim, Marcus continuava ao celular e não viu nada do que acontecia.
— Obrigado! Por favor, você pode chamar meu irmão? É aquele que está ao celular — pedi ao homem de pele queimada, que parecia ter menos de vinte anos.
— Está sentindo alguma coisa? — perguntou-me o de olhos pretos.
— É que está doendo muito — agarrei a perna na tentativa de fazer parar a dor e comecei a chorar.
— Ei! Calma. Olhe! Eu sou fisioterapeuta. Vou fazer uma massagem e, logo, vai passar. Certo?
Aidan, rapidamente, trouxe um óleo para a pele, e o homem massageava minha perna, enquanto conversava comigo. Dizia-me ele que ter câimbra em piscinas é normal, e, também, que certos alimentos ajudam a evitá-las, e ficou a citar alguns. Sorridente, afirmou que iria pedir à minha mãe para cuidar melhor da minha alimentação. Naquele instante, fitei-o.
— Minha mãe morreu há alguns meses — comentei baixinho.
Ele enrubesceu e se desculpou pelo comentário:
— Eu não sabia. Sinto muito.
Era tarde demais, pois o choro havia se apossado de mim.
Marcus e o outro homem chegaram e encontram Aidan agachado, tentando me consolar, o fisioterapeuta em pé, e eu, chorando.
— Ei, maninho. O que foi? O que houve? — perguntou meu irmão, beijando-me o rosto, tentando me acalmar.
— Eu... eu quero ir embora — disse eu, e enxugava as lágrimas com as mãos, tentando não tremer o queixo.
Aidan explicava que eu tive uma câimbra na piscina e que aqueles homens me ajudaram.
— Olhe, maninho. Foi só uma câimbra. Já vai passar. Calma, certo? — repetia Marcus, acarinhando-me os cabelos.
Meu irmão apresentou-se aos homens que me ajudaram e franziu a testa ao olhar para o fisioterapeuta. Então, falou:
— Conhecemo-nos de algum lugar? — olhando-o, curioso.
Foi quando uma surpresa invadiu meus ouvidos.
— Acho que estive no apartamento do Senhor em Nova Iorque com Richard no aniversário dele. Sou Pablo, e este é o meu irmão Juan.
Parei de chorar no mesmo instante. Olhei para eles dois e pensei: O quê? Que mundo pequeno, meu Deus!
Ao lado da piscina, um espaço aberto permitia que respirássemos o ar daquele entardecer. O sol se escondia lentamente diante de nossos olhos. A noite dava as caras em Monte Carlo, e os últimos raios do crepúsculo só poderiam ser apreciados por mais alguns instantes antes de ela firmar-se por completo. A tarde aquecida dava lugar ao vento refrescante e agradável da noite. Mais parecia vento de verão, mas não era, pois estávamos no inverno. Lembro-me bem que aquela mescla de vento, pôr do sol e chegada da noite tornou-se mágica para mim. Aquilo me despertou sensações e desejos. No dia seguinte àquele é que descobri que eu não estava inebriado de alguma força sobrenatural e sob os efeitos das belezas da natureza. Era bebida mesmo. Eu estava quase bêbado! Mas como foi bom estar relaxado naquele dia, e melhor ainda foi o que aconteceu à noite! Que noite! Que noite, meu Deus! Depois do incidente com a minha perna e da feliz coincidência de todos nós termos nos reencontrado, meu irmão, civilizado como era, convidou Pablo e Juan para sentarem conosco. Horas de conversa e muitos drinks foram o suficiente para que meus olhos faiscassem diante do belo Pablo. Ele era latino, nascido no México. Os cabelos pretos e lisos chamavam a atenção, quando iam de encontro ao vento. A barba por fazer e o sorriso travesso eram um charme à parte. E o corpo? Que corpo, meu Deus! Era alto, forte, de pele queimada e exibia uma tatuagem pouco acima da axila esquerda. Todas as vezes que ele levava as mãos ao cabelo por causa do vento, eu tentava adivinhar que tatoo era aquela. Como ele se sentou perto de mim, e do outro lado da mesa estavam Marcus, Juan e Aidan, conversando empolgadamente, nós ficamos mais à vontade. De início, falávamos amenidades. Contou-me ele que, no dia do meu aniversário, poucas horas antes de ir ao apartamento do meu irmão, quase tinha sido atropelado na Times Square, mas, felizmente, nada de grave houve. Disse, ainda, que estava morando em Nova Iorque havia pouco tempo, e que estava gostando de trabalhar como fisioterapeuta. Falávamos sobre os bons lugares de se frequentar em Manhattan, e também sobre como era a vida dele no México. Entre drinks e risadas, um pensamento me invadiu: Será que ele é gay? Não vou dizer nada comprometedor, pois acho que não é. Mas que é um homem bonito, é! Ele é tão masculino! A certeza viria poucos instantes depois.
— Sua perna está melhor? — perguntou ele, olhando-me com aqueles olhos pretos e brilhantes.
— Sim. Não está mais doendo.
— Deixe-me ver — pediu, tomando minha perna, apoiando-a em sua coxa.
Levemente, ele apalpava minha panturrilha direita, enquanto me olhava e perguntava se doía. A cada “não” que eu respondia, ele subia as mãos um pouco mais e suavizava a voz.
— Dói aqui? ... E aqui? ... E aqui?
E continuou perguntando até o sorriso tomar conta de nós dois e eu perceber que ele estava me fazendo um carinho e me olhando com desejo em vez de me examinar.
— Que olhos, meu Deus! — pensei e falei.
E ele ouviu.
— Você gosta dos meus olhos? — perguntou-me, sorrindo, meio envergonhado, com a voz baixa.
— Gosto — respondi, baixinho, mirando bem em sua pupila.
Uma tossida nos desconcentrou. Era Aidan, olhando-nos. Que inferno! Ele está aqui, e de cara feia! Tirei minha perna da coxa do Pablo e pensei: Nunca vi Aidan falando espanhol. Ele é holandês e mora em Nova Iorque desde pequeno. Não deve saber nada da língua latina. Resolvi arriscar a conversar com Pablo em espanhol. E, mentalmente, agradeci à minha mãe e as professoras particulares que tive durante toda a infância, por me ensinarem a falar fluentemente três línguas antes dos dezessete anos:
— Pablo, vou aproveitar que você é mexicano e praticar meu espanhol. Acho que ele não vai entender nada do que dissermos — comentei, diminuindo a voz para que Aidan não escutasse.
Pablo, que já tinha presenciado o vexame de Aidan no dia do meu aniversário, e, naquele dia, a cara feia dele para nós a tarde inteira, entendeu o que quis dizer.
— Sim! Como você quiser. Posso lhe dizer uma coisa? — respondeu ele, diminuindo a voz, em espanhol.
— Sim! — disse, curioso.
— Quero beijar você desde a primeira vez que nos vimos em Nova Iorque. E hoje, durante toda a tarde, fiquei com mais vontade ainda — falou, encarando-me com seus lindos olhos pretos, cheios de malícia.
— Oh, meu Deus! — e ri, timidamente, meio nervoso com o que ouvi, mas mesmo assim fazendo charme para ele.
Minha comunicação com Pablo em espanhol estava funcionando. Aidan olhava-nos com a testa franzida, tentando ouvir e descobrir o que falávamos. E isso quase nos arrancou algumas gargalhadas de tão engraçado que foi.
— Quer ir à piscina comigo? — perguntei a Pablo, insinuando-me para ele.
— Sim — respondeu-me, animado.
Nós saímos da mesa, sob os olhares curiosos de todos. Pablo mergulhou primeiro, e depois fui ao encontro dele. Já era quase noite, e não se via mais a luz do sol. Não havia ninguém na piscina, somente ele e eu nadando de um extremo ao outro, fazendo apostas para ver quem chegava primeiro à outra ponta. Às mesas, apenas alguns casais distraídos. Com certeza, eram turistas ou franceses.
— Eu não sabia que os mexicanos nadavam tão mal assim — brinquei com ele.
— Mas eu ganhei quase todas as apostas — retrucou ele, jogando-me água no rosto.
E rimos, quando pedi ao garçom que nos trouxesse mais um kir para mim.
— O que está bebendo mesmo, Pablo? — perguntei.
— Senhor, um mojito, por favor — disse ele, exibindo-se ao garçom em espanhol.
Aproximei-me dele e fiquei nadando em círculos, enquanto o encarava. Ah, esses olhos pretos!
— Adoro quando você fala espanhol, sabia? — comentei.
— Você pode gostar de outras coisas que eu sei dizer também — completou.
— Uau! Que excitante! — exclamei.
Ele mergulhou e eu o perdi de vista. Passaram-se segundos e nada dele. Encostei-me à borda da piscina, estendi os braços para fora e o procurava com os olhos. E lá vinha ele, nadando por debaixo d’água com sua sunga preta. Parecia um atleta. Chegou perto demais de mim e, roçando o corpo dele no meu, subiu à superfície.
— Oi — disse baixinho.
— Oi — respondi, sorrindo.
Ele tomou minha cintura em seus braços, puxou-me para ele e me beijou. Afastei-me e disse envergonhado:
— Eles estão olhando, Pablo — referindo-me ao meu irmão, Aidan e Juan, que tinham suas cabeças viradas em nossa direção.
— Não me importo — e selou sua boca na minha novamente.
Os lábios dele eram ásperos. Sua língua era ousada, tinha gosto de limão e álcool. Ele beijava com ímpeto, passeando vagarosamente sua mão pelas minhas costas. Encaixou sua perna no meio das minhas e me pressionou contra a parede da piscina. Eu estava preso, mas adorando tudo aquilo. O som do caminhar do garçom, depois de deixar as bebidas ao chão da borda da piscina, não me distraiu, mas o que ele disse com voz empolgante, sim:
— Senhor Barrys, boa noite! Seja bem-vindo! Posso ajudá-lo?
— Estou procurando meus filhos. Eles estão aqui?
Não acreditava no que estava ouvindo. Meu Deus! Meu Deus! É meu pai! Ele está aqui!
Imediatamente, larguei a boca do mexicano e o empurrei.
— O que houve? — perguntou-me ele, sem nada entender.
— Meu pai está aqui!
Deixei Pablo de braços cruzados, rindo do meu desespero, e mergulhei para o outro extremo da piscina. Quando subi à superfície, papai, que já se encaminhava à nossa mesa, viu-me.
— Oi, filho! Por que vocês não me disseram que iriam passar o dia todo aqui? Teria vindo com vocês.
Fique calmo, fique calmo, Gaius. Ajude-me, meu Deus! Dizia eu em meus pensamentos.
— Oi, pai! Nós almoçamos por aqui e perdemos a hora. Quer entrar? A água está bem quentinha.
Eu mal terminei de falar, quando Pablo subiu à superfície perto de mim. Como ele veio tão rápido? E por que ele faz isso?
— Boa noite! — exclamou ele, cumprimentando meu pai, meio sorridente.
— Boa noite! É seu amigo, filho? — retribuiu papai.
— Sim, papai. Este é Pablo. Ele é mexicano e vai passar o fim de ano aqui em Monte Carlo. Pablo, esse é meu pai, Lucas Barrys.
Pablo assumiu um semblante sério no rosto. Parecia incomodado naquele momento. Meio desconcertado, disse ele a papai:
— Boa noite, Senhor Barrys!
Lembro bem do rosto de papai naquele instante. Sua expressão era de quem estava desconfiado. Aquela testa franzida não era só curiosidade. Papai nos deixou e foi ao encontro de Marcus, que estava na mesa com Juan. Onde está Aidan? Não importa! Pensei. Disse a Pablo que devíamos voltar à mesa e dar um pouco de atenção a papai.
— Certo. Mas só se me prometer que vamos nos ver mais tarde — condicionou ele, tentando agarrar minha cintura por baixo d’água.
— Pablo, meu pai está aqui! E nós dois ainda não conversamos sobre eu ser gay. Entende isso? — exclamei com intensidade.
— Tudo bem, tudo bem. Mas vamos nos ver mais tarde?
— Eu... acho que sim. — respondi, cambaleando a voz e com um meio sorriso nos lábios, fazendo charme para ele, enquanto jogava água em seu rosto.
À mesa, papai conversava com os irmãos latinos, e contou que visitou o México há alguns anos, passando parte dos dias em Tijuana. Percebendo que todos estavam empolgados na conversa, aproximei-me do meu irmão e perguntei:
— Onde está Aidan?
— Ele viu você e Pablo se beijando, e saiu. Parecia irritado — respondeu, sussurrando.
— Que droga! Eu não morro de amores por ele, mas também não quero machucá-lo. Que inferno!
A voz do meu pai nos interrompeu.
— O que vocês estão falando tão baixinho aí, hein?
— Nada importante, papai. Gaius perguntou onde estava Aidan, e eu respondi que ele já tinha saído. Que droga, Marcus! Você não devia ter comentado que Aidan está aqui! Pensei.
— Aidan está aqui? Onde está? — perguntou papai a Marcus.
— Acho que ele foi até à suíte pegar alguma coisa, mas não sei se ainda vai voltar.
— Marcus, quero ver Aidan. Mande chamá-lo.
Agora eu estou fodido, meu Deus! Marcus me olhava na esperança de que eu mesmo dissesse o que ele deveria fazer. O que eu faço agora? Papai era muito amigo do pai de Aidan, o Senhor Daan. Praticamente enriqueceram juntos. Dizia sempre que Aidan era o filho loiro que ele não teve. Quando eles três se encontravam nos eventos da empresa ou até mesmo para jogar golfe, não se desgrudavam um minuto. Por vezes, o companheirismo de papai com Aidan no esporte arrancava comentários enciumados do Senhor Daan. Lembro-me que, certa vez, ele comentou que gostaria que Aidan morasse conosco, pois apreciava muito a sua companhia. O que papai não sabia era que, assim como eu, Aidan era gay. E aquele louco queria me pedir em namoro no dia do meu aniversário aos meus pais. Papai iria dar uma surra nele. Grosso do jeito que é! O que faço? Aidan está com raiva. Saiu daqui furioso. E se ele disser a papai que eu estava beijando Pablo? Oh, meu Deus! O que faço? Foi quando minha boca ultrapassou a velocidade do meu pensamento.
— Vou chamá-lo, papai! Vou ao banheiro, e aproveito para chamá-lo! — gritei, tentando controlar a ansiedade da voz, depois que percebi que papai me olhava intrigado.
Ainda tinha as mãos trêmulas, quando apertei o botão 6 do elevador. Olhava para o visor e pensava: vai rápido, vai rápido. E lá estava no mesmo corredor dos belos quadros, que apreciei no início da tarde. O espelho da luxúria me lembrou da última conversa com Aidan, e como o deixei falando sozinho. Droga! Preciso que ele não diga nada a papai sobre o beijo com Pablo. Pensei. A porta da suíte estava entreaberta e, vagarosamente, empurrei-a. Vi-o em pé na sacada da suíte, descalço, apenas de bermuda, com os cabelos molhados e penteados, tendo apenas a companhia de uma garrafa de uísque e um cinzeiro que servia de descanso para o fim de mais um cigarro. Olhava concentrado para o horizonte ou para o grande bosque nos arredores do hotel, ou até mesmo para o nada. Aos primeiros passos, fui recepcionado por nocturne, de Chopin. Minha mãe adorava essa peça. Pensei. Dois abajures acesos ofereciam uma iluminação intimista ao ambiente. Alguns passos meus foram o suficiente para que minha presença fosse percebida por ele. Nisso, virou-se em minha direção. Ele tinha a mandíbula fechada, os olhos vermelhos e o semblante triste. Encarou-me direto na pupila, e deixou que os segundos de silêncio falassem o que sua boca se recusava a dizer. Não foi preciso muito tempo daquele olhar constrangedor para saber o quanto eu o tinha machucado. Mas o ápice da minha consciência se deu quando uma tímida lágrima escorreu dos seus olhos. Ele virou-se para o horizonte novamente e tentou disfarçar, enxugando-a com as costas da mão. Envergonhado, com um nó na garganta, aproximei-me lentamente e pus-me a olhar para horizonte com ele.
— Minha mãe adorava Chopin, sabia? — comentei.
Tive silêncio como resposta. Apenas os uivos dos ventos e a maciez de Chopin podiam ser ouvidos. Era embaraçoso estar ali, principalmente depois do que vi instantes antes.
— Papai perguntou por você — comentei novamente, tentando ver sua reação de soslaio.
— Por que está aqui, Gaius? — perguntou, encarando meu rosto de frente.
— É que você saiu... E papai quer que você vá vê-lo. Então, vim chamá-lo — respondi, gaguejando e sem conseguir olhá-lo direito.
— Acho que prefiro não ver seu pai hoje — comentou, com a voz suave, porém firme.
Virei-me de frente para ele e disse:
— Aidan, sinto muito pelo que aconteceu na piscina. Quero que saiba...
— Você sabe por que estou aqui, Gaius? — interrompeu-me, olhando-me nos olhos, com a voz meio exaltada.
Depois, continuou:
— Vim até aqui por você. Porque senti sua falta. Depois que foi embora de Nova Iorque, vi-me perdido, distante de quem eu amo. Nunca escondi que gostava de você. E não esconderei! O que aconteceu entre nós naqueles dias que passamos juntos foi muito forte para mim. Talvez, não tenha sido para você, mas para mim foi! Você nunca soube, mas é bom que saiba agora que foi o primeiro homem com quem fui para a cama. Não foi o único, mas foi o primeiro. Depois daqueles dias, eu quis ter uma relação, mas você sempre fugiu e me evitou, nunca atendeu ao celular ou quis me encontrar. Então, conversei com seu irmão e disse que estava apaixonado e, também, que iria conquistar você. Marcus sempre me apoiou, incentivou e aconselhou, mas você nunca me deu nenhuma chance de mostrar o quanto eu o amo e o quero fazer feliz. Nunca pensou em como eu me sentia, quando o convidava para uma vernissage ou mesmo para ir ao teatro e você inventava uma desculpa, dizendo que não podia? Nunca pensou em como eu me senti todas as vezes que chegava ao apartamento do seu irmão para ver você, e via quando se trancava no quarto até eu ir embora? Nunca passou pela sua cabeça que eu gostasse de você de verdade? Nunca considerou que o que eu sinto por você é amor? E então eu venho aqui para vê-lo, e o que encontro? Você beijando um cara que mal conhece? É isso que mereço por amar você? Que droga, Gaius! Que droga! O que é que preciso fazer para que entenda que eu amo você, droga? — e, num ato impulsivo e violento, tomou a garrafa de uísque na mão, atirou-a com força na parede, encarando-me ferozmente com aqueles olhos cor de âmbar.
Era janeiro em Nova Iorque. O frio de dezembro e a decoração de Natal desapareciam diante de nossos olhos dia após dia. Os americanos deixavam para trás as emoções das festas e retomavam novamente suas rotinas de trabalho. Tudo voltava ao normal. Ainda morava com Marcus e Núbia em Manhattan, mas já estava preocupado com o estado de saúde da minha mãe, e pensava, seriamente, em mudar para Monte Carlo. Lembro-me que no início daquela primeira semana do ano, meu irmão comentou que iria viajar na sexta-feira para Connecticut para participar de um congresso sobre serviços financeiros imobiliários e que iria aproveitar para descansar. Disse-me que ficaria na cidade uns dois ou três dias a mais depois do fim de semana. Núbia e Arthur iriam com ele.
— E vou ficar sozinho aqui? — perguntei, indignado.
— Olhe, maninho! Se quiser ir conosco, pode ir, não tem problema, mas vou passar o fim de semana inteiro no congresso. Somente na segunda é que vou poder passear. Núbia marcou de encontrar umas amigas do colegial que moram lá para passar o tempo. E na segunda é o aniversário dela. Estamos pensando em ficar um pouco sozinhos, sabe? Ela até já conseguiu para que Arthur fique na casa de uma amiga dela na segunda e na terça. Mas se você quiser ir conosco, tudo bem. Só acho que você não vai gostar.
Estava claro que meu irmão sugeriu, educadamente, que eu não fosse com eles. Que saco! Pensei. Na noite de quinta-feira, depois do jantar, despedi-me deles, visto que iriam sair antes do nascer do sol. Dei um beijo em cada um e fui dormir. Na manhã de sexta-feira aproveitei para organizar alguns livros e jogar fora os cadernos do colegial. Graças a Deus que acabou! Pensei. Eram quase 13h, quando resolvi fazer um sanduíche para almoçar: pão integral, pasta de espinafre com ricota e tomate seco. O sono me chamou, e me entreguei a ele. Eram quase 17h, quando o telefone da sala me acordou. Por que não fechei a porta do quarto, meu Deus?
— Oi. Oi, Aidan. Como vai? — disse, ainda sonolento, ao atender.
Ele comentou que tinha convites para a inauguração de uma confeitaria, no centro de Manhattan, e que passaria às 19h para nos pegar.
— Aidan, meu irmão não está aqui. Ele viajou com Núbia para Connecticut.
Perguntou-me se não queria acompanhá-lo. E, brevemente, respondi:
— Desculpe, Aidan. Fica para outro dia. Tchau — e desliguei.
Corri ao meu quarto e me atirei na cama. Voltei a dormir. Era uma melodia suave, de ritmo constante, mas insistente. O que é isso? Pensei. A campainha da porta tocava insistentemente. Não acredito. Que saco! Acordei.
— Já vai! Calma! — gritava, irritado, encaminhando-me à porta.
Era Aidan. E quando me viu, logo levantou a mão para me mostrar os doces que trouxe.
— Trouxe para você — disse ele, beijando-me o rosto e entrando no apartamento, dirigindo-se para a cozinha, antes que eu o convidasse a entrar.
Tomou um prato, dispôs sobre a mesa, abriu o embrulho e tirou três sonhos americanos recheados com doce de leite. Hum! Adoro doce de leite! Estou com fome. Que horas são? Pensei.
— Obrigado por vir, Aidan. Desculpe, mas não vou lhe acompanhar na inauguração da confeitaria.
Ele sorriu.
— Ei, garoto! A inauguração já acabou. Já são quase 22h.
Como eu dormi, meu Deus! Pensei.
Estávamos ali, comendo sonhos e conversando. Ele me perguntava o que fiz o dia todo, e depois me contou que seu pai, o Senhor Daan, tinha se sentido mal naquela semana. Explicou-me que, com a idade que o pai tinha, não podia mais beber e fumar como fazia antes. Aliviado, falou que foi apenas um susto, mas que o ocorrido tinha chamado sua atenção para a saúde do pai. Foi quando percebi que os sonhos acabaram.
— Não tem mais? — perguntei, sorrindo.
— Se quiser, vou comprar mais para você — ofereceu-se, gentilmente.
— Não precisa. Estou brincando. Vou tomar banho e depois assistiremos a um filme. Certo? — perguntei, dando as costas e caminhando ao meu quarto.
— Espero-o — respondeu, com a voz alta para que o ouvisse.
— Tem bebida na geladeira! — gritei, já tirando a roupa e entrando no chuveiro.
Rapidamente, sequei meu corpo e vesti um calção de pijama branco, penteei os cabelos e pus o meu Luna Rossa. Hum! Adoro Prada, meu Deus! Pensei. Chegando à sala de estar, já o encontrei sentado no sofá com a cabeça recostada e os olhos fechados. Os braços estavam apoiados nas almofadas e ele tinha uma cerveja à mão. Estava descalço, com as pernas abertas e tinha desabotoado os dois primeiros botões da camisa. Ele vestia uma calça sarja cáqui e uma camisa social de manga longa branca. Parei e o olhei. Não conseguia não olhar. E, enquanto meus olhos passeavam vagarosamente por aquele corpo exuberante, seu rosto encontrou o meu, e, abrindo os olhos, penetrou-me ele a pupila com seu olhar. Minha respiração parou. Meu coração acelerou e a adrenalina se apossou de mim. Oh, meu Deus! Estou com tesão! Pensei.