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A Posse De Um Guardião
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Toya ergueu os olhos para o céu noturno que escurecia no momento em que as primeiras gotas de chuva caíram. Esta noite era uma má noite... ele podia sentir isso claro na sua alma. Os seus olhos combinavam com a cor do relâmpago que dançava na escuridão enquanto a tempestade se aproximava.
Incapaz de dormir enquanto Kyoko não estava com ele, Toya subiu num galho alto de uma árvore nos arredores da vila para vigiar. Tudo o que ele podia fazer era esperar até o amanhecer e então ir encontrá-la nos jardins do Coração do Tempo. Se ele pudesse... ela nunca teria ido para casa para começar.
O chão tremeu com o estrondo de um trovão, mas os olhos de Toya se arregalaram... a sua audição captou um grito de terror dentro da tempestade. Esse grito tirou o seu fôlego. – Kyoko? – O que ela estava a fazer aqui a esta hora da noite sem lhe contar primeiro?
Os seus olhos instantaneamente se transformaram em prata derretida quando os seus instintos protetores se aceleraram. Ele nunca a ouviu tão assustada, mesmo durante a batalha. O seu batimento cardíaco voou quando as suas asas prateadas ganharam vida e ele decolou quase rápido demais para o olho humano detetar.
– Kyoko? – O grito de preocupação saiu da sua garganta.
*****
Shinbe ficou do lado de fora da cabana de Suki, sem conseguir dormir mais. Os seus pesadelos não permitiam. O seu olhar ametista travou na floresta que mantinha o portal do Coração do Tempo. Algo estava errado, ele podia sentir... não tinha nada a ver com a tempestade que se aproximava e agora assolava a floresta.
– Kyou. – O que Kyou estava a fazer tão perto? Por um longo momento, a garganta de Shinbe se recusou a funcionar e a sua respiração parou no seu peito enquanto olhava para a distância. Ele podia senti-la... Kyoko estava de volta. O seu cabelo azul meia-noite balançava com os ventos tempestuosos que traziam o cheiro da raiva do seu irmão com ele e o seu punho cerrou. Ela não estava sozinha... Kyou estava com ela!
Ele agarrou o seu cajado que estava encostado no batente da porta. Shinbe sabia que não precisava de chamar os outros, já podia senti-los parados atrás dele. Asas translúcidas de ametista se espalharam ao redor dele quando os seus pés deixaram o chão.
Kamui rapidamente o seguiu, deixando um rastro de poeira multicolorida no seu rastro. Kaen rugiu para a vida levantando Suki para se juntar à perseguição.
*****
– Não! – A voz de Kyou estava severa como se a repreendesse por algo que não aprovava. Não desta vez. Ele não seria negado desta vez. Queria tocá-la antes, durante o calor da batalha, mas nunca o fez. Algo o avisou que o contacto seria perigoso para os dois, então se conteve.
Desta vez, ele iria apaziguar a sua verdadeira natureza. A sua alma o tinha atormentado por tempo suficiente. Ela foi a única humana que o enfrentou em batalha ou em qualquer outro lugar e não fugiu com medo. Ele apertou os braços para deter a sua luta.
Sabia que os seus irmãos a amavam... mas Toya estava apaixonado pela sacerdotisa. Ficava com raiva pelo seu irmão estar perto de algo que desejava para si mesmo. Ele ainda não conseguia entender por que Toya não tinha acasalado com ela, mas a deixou livre e indefesa. Ele não percebeu que o inimigo poderia levá-la embora? O simples pensamento de Toya tomando-a como sua enviou uma onda de possessividade pelos seus braços enquanto a segurava.
Kyou sabia que Toya a tinha ouvido gritar por socorro. Podia sentir o guardião de prata a se aproximar numa velocidade alarmante. Ele não apenas a ensinaria a não vagar sozinha à noite... também ensinaria ao seu irmão ingénuo uma lição por deixá-la fazer isso.
Com um pensamento rápido, criou um escudo que sabia que o seu irmão não poderia quebrar. Olhou para a rapariga cujos olhos esmeralda estavam arregalados com o medo que ele causou. Kyou tirou a mão dos lábios dela apenas para substituí-la pelos lábios... cortando o choro dela. Reivindicou a sua boca num beijo duro e faminto, implacável na sua busca. No momento em que a provou, era tarde demais para devolvê-la.
Kyoko imediatamente começou a lutar contra ele, tentando recuperar o fôlego. O que ele estava a fazer? Ela nunca tinha sido beijada antes e não foi isso que sonhou como o seu primeiro beijo. Ela gritou contra os seus lábios apenas para ser invadida.
Kyou enfiou a língua dentro dela enquanto segurava o seu rosto imóvel, os dedos entrelaçados no seu cabelo ruivo sedoso. A outra mão dele deslizou para trás sob a saia dela, acariciando a pele lisa antes de encontrar o algodão macio entre as suas coxas.
Ele observou fascinado quando os seus olhos arregalados se fecharam instantaneamente e ela choramingou no beijo. Kyou podia sentir a sua confusão de querer desesperadamente que ele parasse, mas também de querer mais enquanto ele trazia o seu corpo à vida com sensações que ela nunca tinha sentido antes. Havia muitas coisas que ele lhe ensinaria esta noite.
Os seus olhos dourados brilharam quando uma onda incandescente de desejo disparou por ele e nas suas virilhas enquanto ele se pressionava contra a suavidade arredondada do seu quadril. Ele não pretendia chegar tão longe... o que ele fez.
A adrenalina de Toya deu-lhe velocidade até que a sua visão captou um leve brilho azul vindo de dentro da escuridão da floresta. Ele pousou rapidamente, derrapando ao parar quando os encontrou. Uma barreira azul fluorescente cercou Kyou e a sua refém, estalando com energia perigosa. O que encontrou os seus olhos o despedaçou e o encheu de fúria ao mesmo tempo.
– Kyou. – Toya rugiu de raiva. Lançando as mãos para baixo ao lado do corpo, as suas adagas passaram a existir. Agarrando as armas sagradas com firmeza, cruzou as lâminas brilhantes. O poder dentro das adagas gémeas pulsou para a vida causando uma onda de choque ao redor dele... enviando o seu cabelo para trás e revelando a raiva que transparecia no seu rosto.
Toya rugiu enquanto se lançava contra a barreira e batia com as suas lâminas contra ela, apenas para ser repelido para trás quando raios de energia dispararam da superfície do escudo. O seu corpo bateu no tronco de uma árvore enorme, parando o seu voo. Ele rosnou enquanto deslizava pela casca áspera.
Levantando-se da terra compacta, Toya observou com raiva enquanto o seu irmão continuava a beijar Kyoko. Ele então percebeu os músculos do braço de Kyou se contraírem levemente e seguiu o movimento descendo até a sua mão. Vendo a mão do seu irmão sob a saia dela, a raiva o atingiu bem no peito! Os movimentos musculares do seu braço só podiam significar uma coisa. Essa raiva aumentou enquanto o seu irmão continuava, sabendo que ele estava a assistir.
– Kyoko! – Toya podia sentir o seu sangue guardião ferver enquanto ele gritava o nome dela. Kyoko era dele e ele não deixaria Kyou tocá-la dessa forma. – Seu desgraçado! – Novamente uma onda de energia varreu ao redor dele, enviando sujidade e detritos para as árvores com a onda de choque.
A mente de Kyoko foi atormentada quando o seu corpo começou a traí-la. Ela bateu em Kyou em todos os lugares que o seu pequeno punho poderia acertar até que ela teve que agarrar a frente da camisa dele para se segurar porque os seus joelhos estavam a enfraquecer. Ela empurrou contra o seu peito o mais forte que podia, mas só conseguiu fazê-lo aprofundar o beijo inebriante e dar mais acesso a sua mão acariciante.
Ela ouviu Toya gritar o seu nome e sabia que ele estava perto o suficiente para vê-la, mas Kyou não iria afrouxar o seu controle sobre ela. O beijo se tornou mais exigente conforme os seus gemidos e movimentos frenéticos se tornavam mais intensos. Ela deu-lhe um pontapé apenas para ter a sua perna presa entre as dele. Ficando frustrada, ela tentou mordê-lo, mas também não funcionou muito bem.
Ele não a estava a magoar. Em vez disso, o que estava a fazer era tão bom. Ele agora a estava a segurar entre as pernas num aperto rítmico que a fez sentir como se estivesse a montar a sua mão... era uma tortura injusta. Ela nunca tinha considerado Kyou capaz de um beijo... muito menos um toque tão ousado. Por ser tão atraente era... o próprio pensamento fez com que a sua mente e corpo travassem uma guerra enquanto ela ainda tentava ganhar a sua liberdade.
Kyou estava a gostar da sua determinação de lutar contra ele, mas podia sentir que ela estava a ficar confusa com a sua reação ao beijo e ao prazer que ele estava a dar-lhe. O seu jovem corpo intocado ansiava por isso, mesmo enquanto ela lutava com todas as suas forças escassas. Deu-lhe ainda mais satisfação saber que Toya agora estava a observar de fora do escudo que ele tinha criado ao redor deles.
Ele podia senti-la a responder ao seu toque e quase gemeu quando o seu corpo a traiu ainda mais. Os seus gemidos se tornaram mais pronunciados conforme o seu lado sacerdotisa ganhava vida... o lado da sua alma que pertencia apenas aos guardiões. Ela não cedeu. Ela ainda lutava com ele, mas não importava, pois a escolha foi feita. Ele tinha ido longe demais para voltar agora.
O olhar de Kyou se fixou no de Toya, querendo que ele visse, que o visse despertar a sua paixão indomável. A expressão no rosto de Toya... o olhar nos seus olhos naquele momento. Sim, agora o seu irmão sabia o preço que pagou quando tirou os olhos daquela que deveria proteger. Na mente de Kyou... serviu a Toya o direito de perdê-la assim.
Os seus suspiros foram o suficiente para ele quase perder o controle ao qual estava a se segurar por um fio. Foi inebriante, para dizer o mínimo. Toya saberia o que era querer algo que o seu irmão tinha e saber que estava fora do seu alcance.
Kyou podia sentir a sua luta se tornar mais fraca e sabia o porquê, enquanto a sentia tentar não se apertar mais contra a mão dele, onde o calor húmido agora irradiava dela. As suas costas estavam arqueadas e os seus olhos estavam fechados, os seus longos cílios caindo sobre as bochechas coradas.
Assim que ela alcançou o cume da montanha que ele a forçou a escalar, ele tirou a boca da dela, deixando o seu grito sedutor ecoar ao redor deles. O rosto de Kyou não tinha expressão, mas os seus olhos brilhavam enquanto observava, sentindo a carne aquecida do corpo dela contra a dele. Ele apenas a tocou... tal paixão se escondia profundamente dentro da sacerdotisa.
A confusão de Kyoko quebrou quando se sentiu pulsar contra a sua mão e ergueu a cabeça para olhar para Kyou. A sua aparência angelical desmentia a sua má ação. Ele não era melhor do que o seu tio Hyakuhei. Ela sentiu que toda a força da sua raiva mortificada anulava qualquer medo que ainda tinha. Ela ergueu a mão e bateu com força na bochecha dele, em seguida, parou quando percebeu que provavelmente tinha acabado de assinar a sua sentença de morte.
Quando o som da bofetada desapareceu, Kyoko ergueu o queixo em desafio enquanto a chuva zumbia contra o escudo externo da barreira. – Eu te odeio. – ela sibilou enquanto lágrimas humilhadas saiam dos seus olhos.
Kyou não ficou afetado e não fez nenhum movimento para deixá-la livre enquanto o seu olhar se fixou no dela, agora furioso e assustado. Gostassem ou não, o seu sangue guardião a tinha escolhido e por causa disso... os dois estavam condenados. Kyou gostou do cheiro da raiva dela. Era como um afrodisíaco para ele, mas ele sentiu a faca quente do ciúme quando ela voltou a sua atenção para o seu irmão.
Os olhos de Toya agora estavam escondidos atrás da franja do seu cabelo prateado da meia-noite enquanto ele os observava. Ele sabia que não poderia partir a barreira que Kyou tinha criado, mas ele ouviu as palavras dela. Ela odiava Kyou e cabia a ele libertá-la da sua escravidão.
– Kyou! – O rosto de Toya se ergueu para mostrar os olhos prateados de raiva. – Nós somos os seus protetores... os seus guardiões. Devolve-a! Agora! – a sua voz era áspera e irritante dentro do som da chuva forte.
Kyou ainda assistia Kyoko. Ele deslizou a palma da mão contra a sua bochecha carinhosamente enquanto os seus olhos dourados se fixavam nos dela. – Tão possessivo. – ele sussurrou como se estivesse a falar consigo mesmo, ainda observando o fogo a sair dos olhos dela. O fato de que agora ela o temia ainda menos por causa da sua raiva o fez sorrir por dentro.
Voltando o olhar para o irmão, os olhos de Kyou se estreitaram perigosamente, mas a sua voz permaneceu fria e sem sentimento. – É tarde demais. Tu foste negligente na tua proteção à nossa sacerdotisa por ela ficar sozinha no santuário tão tarde da noite.
Kyoko tentou se afastar dele, mas o seu aperto ficou mais forte. – Deixa-me ir, seu idiota! – Ela olhou por cima do ombro para Toya querendo gritar o seu nome, precisando da sua ajuda. Mas os seus lábios permaneceram selados, não querendo que os irmãos lutassem.
Ela sabia que Kyou era forte, mas também sabia que se estava com raiva... A força de Toya era ilimitada. Uma batalha entre eles seria muito perigosa. Ainda assim, ela não pôde evitar o olhar suplicante que brilhou nos seus olhos esmeralda... aquele olhar por si só foi um grito silencioso para ele ajudá-la.
Como se estivesse a ler os seus pensamentos, Kyou agarrou o seu queixo e trouxe a sua atenção de volta para onde pertencia. – Nunca. – ele rosnou vendo os olhos dela se arregalarem em alarme. Então, levando os dedos à pulsação do seu pescoço, ele pressionou, pegando-a quando o seu corpo ficou mole e ela silenciosamente deslizou contra ele. Ele quase se arrependeu de colocá-la a dormir... quase.
Toya sabia que o seu irmão era mais forte, mas ainda... não tinha o direito de tomá-la. Ele podia ler o desejo estranho nos olhos de Kyou enquanto olhava para Kyoko. – O que tu estás a fazer? Droga! Devolve-a! Eu sempre a protegi. – Ele esperou enquanto o seu irmão apenas olhava para ele.
Kyou podia sentir o que o seu irmão não podia. O mal estava a se aproximar deles na forma de Hyakuhei e os seus asseclas. Esta seria outra lição para o seu querido irmão aprender da maneira mais difícil.
Toya soltou a sua respiração reprimida enquanto as suas mãos se apertaram em punhos ao lado do corpo. – O que tu estás a pensar Kyou? Ela é a nossa sacerdotisa! – Ainda sem obter uma resposta, Toya sussurrou: – Eu pensei que tu disseste que os humanos estavam abaixo de ti... por que tu fizeste... isso?
O rosto de Kyou permaneceu calmo e a sua voz suavizou por um breve momento, como se estivesse a falar com uma criança rebelde – Se tu tiraste os olhos dela, ela te será tirada. Tu, irmão, não sabes o significado da verdadeira proteção.
Kyou já tinha voltado a sua atenção para a rapariga mole em seus braços. O seu irmão a amava, mas nunca lhe disse, que irónico. Ela amava o seu irmão, mas... ele pretendia roubar esse amor. Ele queria isso... ansiava por isso e não seria negado.
As suas orbes douradas voltaram-se para Toya enquanto a sua voz endurecia. – Hyakuhei está perto... tu não consegues senti-lo? Ela estaria em perigo. Tu a deixaste intocada, sem marcas, desprotegida e sozinha... esperando por ele. Não vou cometer o mesmo erro.
Toya observou a sombra das asas douradas de Kyou ganhar vida, destruindo a barreira que os cercava no segundo em que as penas poderosas tocaram a sua superfície. Ele gritou em negação quando Kyou desapareceu com Kyoko no seu abraço apertado. O som ricocheteou, não deixando nada para trás, exceto o rugido da tempestade que ainda assolava a floresta.
Ele sabia que tinha falhado com ela agora, mas ele iria encontrar uma maneira de libertá-la do seu irmão. Kyou estava certo em repreendê-lo pela sua falta de vigilância sobre Kyoko, mas beijá-la... tocá-la assim... então tirá-la da sua proteção. Por quê?
O sangue de Toya ferveu quando o eco da ameaça de Kyou ressoou na sua mente. – Sem marca? – Ele rezou para que Kyou não quisesse dizer que tomaria Kyoko como sua companheira apenas para protegê-la. Toya rosnou com o próprio pensamento.
– Não mesmo! – Ele gritou para o espaço agora vazio. Ele esteve sempre ao lado dela, não Kyou. Kyou odiava humanos e nunca mostrou nenhum interesse em Kyoko. Por que ele de repente faria algo tão precipitado? O próprio ar em torno de Toya tornou-se vivo com fúria reprimida enquanto os seus poderes de guardião aumentavam perigosamente com a sua raiva.
– Kyou, droga! Eu não vou permitir isso. – A voz de Toya podia ser ouvida por toda a floresta.
Capítulo 3 - Escuridão Descendente
Shinbe pousou atrás de Toya tendo chegado assim que Kyou e Kyoko desapareceram. Os outros desceram atrás dele enquanto observavam a aura poderosa de Toya se expandir ao seu redor em ondas azuis fluorescentes.
O rosto de Kamui mostrou o choque do que ele acabara de testemunhar, enquanto os reflexos roxos no seu cabelo indomado farfalharam com os ventos da explosão de Toya. Os seus olhos pareciam mudar de cor com cada batimento cardíaco confuso que se seguiu. – Kyoko? – A sua voz parecia sem fôlego enquanto o seu lábio inferior tremia em rebelião. Pó multicolorido brilhante caiu das suas asas translúcidas quando ele as ergueu num golpe poderoso com a intenção de perseguir aquele que tinha tirado Kyoko deles.
Um flash de relâmpago recortou as asas escuras do inimigo enquanto ele brilhava para a vida bem no caminho de Kamui. O cabelo comprido da meia-noite de Hyakuhei se ergueu com a corrente causada pela sua queda repentina. Os seus olhos de ébano travaram com os de Kamui, fazendo com que o guardião recuasse na sua corrida para resgatar Kyoko.
– Pobre criança... tu perdeste alguma coisa? – A voz de Hyakuhei tinha uma nota de preocupação, mas os seus olhos de ébano denunciaram as suas verdadeiras intenções. Deslizando para a frente, ele estendeu a mão para tocar a bochecha pálida de Kamui, apenas para rir quando o guardião se atirou vários metros para trás para evitar o contacto.
– Sempre tão arisco. – Ignorando o outro guardião ainda no chão, Hyakuhei espreitou o menino de olhos brilhantes enquanto ele se retirava, – Vem agora Kamui, como tu vais realmente me derrotar... se tu não tiveres a tua sacerdotisa contigo? – Ele conhecia os medos do menino melhor do que ninguém. Os seus lábios sugeriram um sorriso sádico. Afinal... foi ele quem ensinou a Kamui todos aqueles medos.
Kamui quase engasgou com o pânico que aumentava cada vez mais. Ver o monstro na frente dele foi quase tão mau quanto sentir o monstro escondido dentro... o demónio dos sonhos. Ele podia sentir isso na frente dele, por trás do rosto do seu inimigo, memórias de pesadelos que ele tinha enterrado há muito tempo voltaram para assombrá-lo enquanto ele lutava contra o desejo de fugir do homem diante dele.
Sentindo o terror de Kamui inundar a área, Shinbe gritou: – Deixa-o em paz, traidor! – Erguendo o seu cajado, ele usou a sua telecinesia para enviar um ataque de pedras e terra ao seu tio para distraí-lo por tempo suficiente para Kamui escapar.
Com um aceno de mão, Hyakuhei criou uma barreira para os projéteis ricochetearem inofensivamente, os seus olhos negros se voltaram para o guardião ametista com raiva. – Não interfiras com algo que tu não conheces, querido sobrinho.
Kamui caiu no chão, caindo de pé enquanto empurrava as memórias sombrias para trás, esperando que elas ficassem escondidas por mais algum tempo. Elas eram os seus segredos para mantê-los e mantê-los era o seu dever. Kamui piscou... os seus olhos voltando ao estado normal de brilho. Ele nunca se lembraria do que Hyakuhei o desafiava a lembrar... ele olhou para os outros guardiões desejando que a mentira fosse verdade.
Toya tinha visto o suficiente e ele agarrou. Com velocidade mais rápida do que o olho humano poderia detetar, Toya pareceu, desapareceu e reapareceu atrás de Hyakuhei. Envolvendo o seu braço em volta do pescoço do inimigo num aperto mortal, ele rosnou: – E o que diabos tu achas que podes fazer sobre isso... querido tio?
Os olhos de Hyakuhei se estreitaram quando ele percebeu que a raiva de Toya tinha libertado um poder igual ao dele. Vendo que Kamui tinha escapado do seu alcance por enquanto, ele sorriu enganosamente. – Como tu pretendes me impedir quando não consegues nem mesmo proteger uma rapariga? Tu já perdeste.
Ele sabia que ainda podia torturar a sacerdotisa com as memórias sedutoras escondidas nas profundezas dos sonhos. O espírito dos sonhos veria que eles ficavam ligados. Mais cedo ou mais tarde... ela iria até ele de boa vontade. Kyou não a teria por muito tempo. Mesmo agora ele podia senti-la a dormir... esperando por ele se juntar a ela nos seus sonhos.
Com uma risada perversa, o corpo de Hyakuhei desapareceu, deixando Toya gritar de raiva mais uma vez.
*****
A escuridão cercou Kyoko na sua escuridão e de alguma forma ela sabia que estava mais uma vez a dormir. A realidade desapareceu em segundo plano e ela se encolheu por dentro, sabendo que o sonho tinha encontrado uma maneira de continuar. Ela tentou lutar... acordar para que não pudesse alcançá-la, mas a calmaria do mundo dos sonhos era muito forte.
O tempo e o espaço não tinham significado quando o sonho se tornou real para ela. Kyoko estava quente, quase quente demais e a sensação estava a se tornar difícil para ela acordar. Lutou para tentar sacudir a escuridão que a deixou tão fraca e perdida. Movendo os dedos ao lado dela, ela sentiu a maciez da pele. Ficou ciente o suficiente para perceber que estava deitada em algum tipo de pele.
Abrindo os olhos, ela olhou para um teto de pedra e deixou a sua visão traçar através dele até as paredes de pedra que a cercavam. Ela estava numa caverna de algum tipo. A luz cintilou em todas as cores ao seu redor de uma pequena fogueira que estava a apenas cerca de três metros de distância. Foi realmente de tirar o fôlego como só o sonho poderia ser.
Tentou se sentar, mas imediatamente se arrependeu do movimento, recostando-se o mais lentamente que pôde. A sua cabeça doía e ela estava fraca... como se toda a força tivesse acabado de ser retirada dela. O que aconteceu?
Os seus lábios se separaram quando as memórias começaram a voltar. Desta vez, sentou-se rapidamente sem se importar com a dor, ainda segurando a cabeça entre as mãos na esperança de firmar a visão.
Parecia que ela estava nas profundezas da terra por causa das formações de cristal ao longo do teto e das paredes. Havia apenas uma entrada que podia ver e era pequena, então o fogo estava a fazer um bom trabalho no aquecimento da sala. Sem dúvida, sem isso, a caverna teria sido muito fria.
Fechando os olhos novamente e esfregando as têmporas, tentou pensar racionalmente. O Cristal do Coração Guardião... Ela o quebrou para impedir Hyakuhei de obtê-lo. Essa foi a última coisa que ela se lembrou. Abrindo os olhos novamente, ela podia ver com mais clareza.
Olhando para baixo, percebeu que estava deitada numa pele da cor da meia-noite. Kyoko gemeu... Hyakuhei a tinha. Ela sabia disso. Por que mais ela estaria deitada sobre o que parecia ser um manto de pele preta bem fundo num buraco na terra... só Hyakuhei poderia ser tão louco.
Ela queria chorar, mas sabia que não, porque se cedesse ao medo... talvez nunca parasse de chorar. Verificando o seu corpo em busca de ferimentos para manter a sua mente longe dos seus medos, ela percebeu que estava ilesa e imediatamente se sentiu melhor. Se Hyakuhei fosse matá-la... ele já teria feito isso... certo? Ela estremeceu com a pergunta persistente.
Olhando ao redor, Kyoko se sentiu melhor vendo que estava sozinha. Se ela tentasse escapar, agora seria a hora. Ela só esperava ter a energia necessária para fugir da caverna sem que Hyakuhei soubesse.
Rastejando nas suas mãos e joelhos, ela se firmou. Levou toda a sua força apenas para ficar de pé. Lutou contra a onda de tontura que a invadiu. O que ele fez com ela? Ou foi o estilhaçamento do cristal que roubou a sua resistência. Ela se sentia como se estivesse perdida num sonho e só esperava que fosse verdade.
Ela não queria ser um bebé, mas daria qualquer coisa agora para um dos guardiões vir e salvá-la. Depois de estar num mundo cheio de demónios por tanto tempo... nada a assustava muito, mas agora... ela estava silenciosamente apavorada.
Kyoko voltou a sua atenção para a abertura da caverna. Embora houvesse luz dentro da caverna, parecia terrivelmente escuro do outro lado da abertura. Ela se aproximou da saída quase com medo do que encontraria do outro lado.
Ela podia sentir a diferença de temperatura ao chegar à abertura. Podia até sentir o frio a tentar entrar na sala quente e quase a fez querer o calor da pele preta onde estava deitada. Olhando para trás por cima do ombro, ela contemplou retornar ao calor, mas rapidamente baniu o pensamento.