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Em alguns minutos, o doce aroma do caldo lembrou Ravana de que não comia desde o meio dia, mas ela esperaria até cuidar dos outros dois antes de atender às suas próprias necessidades.

Depois que o caldo esfriou um pouco, ela pegou o gatinho nos braços, mergulhou o dedo no líquido espesso e pressionou sobre os lábios do gatinho.

Tribi-Leya cheirou o caldo quente e depois lambeu o dedo da garota miando por mais. Ela lambuzou-se de mais caldo para ele. Desta vez, ele tossiu um pouco, mas, ainda assim, lambeu tudo e queria mais.

Ravana sorriu. Não era o leite da mãe, mas era a coisa mais próxima que ela tinha, e talvez ele pudesse se nutrir um pouco com isso.

Quando a barriga dele estava cheia, ela o deitou em seu ninho, onde ele se aconchegou e foi dormir.

Agora a parte difícil, pensou Ravana, acrescentando alguns pedaços de carne ao restante do caldo quente, depois o levou, junto com a outra tigela, em direção à margem do rio.

Ela colocou as duas tigelas e uma folha de bananeira grande que cortara ao longo do caminho ao lado do grande felino. Então, foi até a margem do rio pegar um punhado de lama.

Ajoelhando-se ao lado do gato, ela pegou as raízes e as folhas cozidas da tigela, bateu a mistura como uma panqueca e inspirou profundamente antes de prosseguir.

Colocando cuidadosamente o cataplasma quente no quadril do gato, ela o espalhou suavemente ao redor da flecha para cobrir a ferida purulenta.

No começo, a onça apenas suspirou, se contraindo um pouco, mas em seguida seus olhos se abriram e ela viu a garota tocando-a.

Miki-Leya rosnou e levantou a cabeça, mas Ravana estava pronta para ela, enquanto segurava o cataplasma no lugar com a mão direita, cuidadosamente empurrou a tigela de caldo sob o nariz do gato com a mão livre. A fome superou sua preocupação com a garota, e a felina começou a lamber o caldo, pegando os pedaços de carne com a língua e devorando-os.

A tigela logo ficou vazia e, antes que a gata tivesse tempo de fazer qualquer coisa, Ravana empurrou o último pedaço de anta perto o suficiente para que a felina o alcançasse.

Quando Miki-Leya comeu a carne, a garota cobriu o cataplasma com uma folha grande e depois espalhou lama por cima. Durante todo o tempo ela falava com a gata:

– Você deve descansar em silêncio agora, sua cria está segura pelo fogo, alimentada e dormindo, não se preocupe.

A gata parecia não prestar atenção enquanto triturava o último dos ossos e lambia a medula.

Ravana manteve uma leve pressão no cataplasma enquanto falava e acariciava o pelo dela.

– Você deve descansar e juntar suas forças. – ela sussurrou – Tudo ficará bem em breve.

Miki-Leya lambeu os lábios, olhou uma vez para o som da voz da garota, depois deitou a cabeça fechando os olhos.

Ravana, em sua absorção pelos dois felinos, não pensara na aldeia ou na mãe por muitas horas. Agora ela se preocupava com a aflição da mãe por ela, mas não podia deixar os animais; os dois eram completamente dependentes dela.

O som de um papagaio verde tucumă, agitando sua companheira despertou Ravana e ela, imediatamente, percebeu a dor em seu braço. Levou um momento para entender onde estava e o que havia acontecido. O sol não havia ainda nascido, mas o amanhecer se arrastava pela floresta tropical. Ela levantou a cabeça do flanco da grande felina, onde havia adormecido. Quando virou a cabeça, encontrou o gato olhando para ela, aparentemente com pouca preocupação.

Ravana levantou a mão do emplastro e esfregou o braço, estava dolorido por permanecer na mesma posição durante toda a noite.

–Você deve estar com fome, grande amiga —disse ela enquanto esfregava a circulação de volta no braço – Se prometer não mexer nesse curativo em seu quadril, eu caçarei para você.

A gata não emitiu nenhum som, apenas bocejou e deitou a cabeça na grama.

A garota sorriu e ficou logo de pé.

–Voltarei em breve – disse ela ao deixar Miki-Leya e voltar à fogueira para pegar seu arco e flechas.

Cian tomou um gole de chá e me lançou um olhar sobre a borda de sua xícara.

– Bem, crianças – eu disse – acho que já tivemos história suficiente para esta noite, já é tarde e hora de dormir.

Magnalana olhou para mim com os olhos estreitos.

–Nós queremos…

O capitão Sinawey pigarreou, encerrando qualquer protesto dela ou das outras crianças.

A pequena Magnalana olhou para o capitão, depois voltou seu olhar para Cian.

–Obrigada, Cian, adoramos sua história. Quando podemos ouvir mais, por favor?

– Amanhã, minha querida – disse Cian – Depois de lavar as roupas e pendurá-las para secar, teremos mais histórias.

O pequeno Billy, não tão articulado quanto Magnalana, foi até Cian para um abraço.

* * * * * *

Cian e eu caminhamos pelo convés em direção à proa do Borboleta. O céu noturno estava perfeitamente limpo e uma brisa suave passeava de leste a sudeste, atravessando o convés.

– Ainda hoje – eu disse – atravessaremos o equador para o hemisfério norte.

Gostaria de saber se ela entendeu quando olhou para mim, esperando por uma explicação. Cian era uma mulher excepcionalmente brilhante, mas ela não possuía todo o conhecimento para além de sua própria cultura, tanto quanto eu não compreendia sua sociedade e valores. Ela se adaptava rapidamente aos novos ambientes e ideias. Se eu tivesse sido empurrado repentinamente e sozinho em seu mundo, como ela foi atraída para o meu, não tinha certeza se teria me adaptado tão bem. Mas ela levara tudo tranquilamente, com seu típico bom humor e entusiasmada curiosidade.

Eu tentei explicar como a Terra era redonda, girando sobre o próprio eixo e voando pelo espaço, esperava que esse conceito fosse difícil de entender, especialmente para quem, por exemplo, não tinha palavras em sua língua para números além de dez, muito menos para descrever a imensidão do universo. Era complexo, mas ela esperou pacientemente por mais informações.

– O céu – expliquei – percebe como as estrelas de primeira magnitude brilham com mais brilho aqui, no cinturão da Terra, do que nas latitudes mais baixas?

– Ah, sim – disse Cian.

Ela compreendia as estrelas total e completamente, apontou várias constelações para mim, explicando seus nomes Yanomami e me mostrou como as posições delas no céu noturno haviam mudado à medida que avançávamos a norte e a leste. Ela conhecia as estrelas e seus padrões de migração anual através dos céus, assim como qualquer navegador poderia conhecer. Eu me perdi rapidamente no seu vasto fluxo de conhecimento das estrelas e até dos planetas visíveis, e pude ver que isso lhe dava algum prazer. Tentei fazer perguntas inteligentes, como ela sempre fazia quando lhe explicava algo, mas fiquei realmente perdido e completamente desarmado, além de profundamente impressionado. Eu me perguntava em que outros assuntos ela se mostraria especialista, que, se eu tivesse as habilidades para perguntar, poderia aprender com ela.

Ela parou depois de um tempo e ficou sorrindo para mim. Me contou como ela e seu povo antes dela usaram o conhecimento das estrelas para encontrar o caminho pela selva e para prever a chegada das estações secas anuais, quando sua partida pode ser percebida à medida que as estações mudam e os animais migram de uma área para outra para encontrar comida.

– Você percebe – perguntei a ela – que existem estrelas abaixo de nossos pés e acima de nossas cabeças?

Ela olhou para o convés e longamente para o mar.

–Como pode ser?

Fechei minha mão em punho.

– Esta – eu disse – é a terra. Redonda como a bola de Billy. É onde estamos – Toquei o topo do meu punho —Aqui estão as estrelas. – Revirei a mão aberta sobre o punho apontando para o céu.

Ela olhou para a minha mão e seu olhar caminhou ao céu assentindo.

–Se pudesse olhar diretamente através do mar e da terra para o outro lado, também veria uma cúpula de estrelas.

Revirei minha mão aberta em torno e abaixo do meu punho. Ela pareceu confusa por um momento, depois girou as mãos lentamente em volta do meu punho e seu rosto se iluminou.

– Isso explica aquilo – disse ela, apontando para o horizonte norte.

Lá, ela me mostrou várias constelações que nunca tinha percebido antes. Ela estava tentando descobrir o sentido para noite após noite, essas novas constelações subirem cada vez mais alto no céu, enquanto aquelas familiares a ela afundavam atrás de nós.

– Sim, sim – ela exclamou – a Terra é redonda, estamos aqui, e as estrelas estão por toda parte – disse tocando meu punho cerrado.

Ela suspirou, pegou minhas mãos entre as dela enquanto se recostava no parapeito e observando o céu enquanto se aproximava de mim.

–Como isso tudo é maravilhoso – ela sussurrou – assim como viajar entre as estrelas completamente despidos e indefesos exceto pelos nossos pensamentos.

Sorri também, ao perceber que a mulher que amava estava muito além de uma equidade intelectual para comigo. Imaginei se ela teria chegado à mesma conclusão.

De volta ao presente, ela deslisou seus olhos para mim e me fitou por um momento.

–Agora me diga, Sr. Saxon, se há estrelas abaixo de meus pés, estrelas acima da minha cabeça e estrelas ao redor de toda a bola de Billy, onde está nosso amigo Deus agora?

Eu tinha certeza que ela já sabia a resposta antes de fazer a pergunta.

Capítulo Doze

Fiquei sozinho na ponte do Borboleta madrugada afora, observando a lua afundar em direção ao horizonte ocidental à minha esquerda, enquanto o horizonte oriental se iluminava. A noite estava quente, o mar tranquilo, o vento calmo; tudo em equilíbrio, um equilíbrio perfeito.

Até demais.

Isso me deu uma sensação de desconforto. As coisas pareciam não se conectar, era quase assustador.

Desliguei as luzes interiores e olhei para a bússola brilhante.

Hero entrou na ponte, parecendo pensativo e deslocado.

–Bom dia, tutti – eu disse a ele —Eu pensei que havia fechado a porta.

O cachorro tinha uma maneira desdenhosa de estreitar os olhos, se virou para olhar algum objeto qualquer, como se fosse mais interessante para ele do que eu. E ele odiava quando eu o chamava de tutti.

Ele se aproximou do leme e sentou-se no rabo, perto de mim, sem emitir nenhum som. Isso era realmente estranho, o cachorro nunca se importou muito comigo e raramente me procurava.

O que o estava incomodando?

–Por que não está com Rachel?

Ele me deu uma expressão que se traduzia aproximadamente em: “Saxon, cale a boca e olhe lá pra fora.” Algo estava acontecendo.

Muito além da proa do navio, a paisagem marítima mudou diante dos meus olhos, o sol nasceu ao mesmo tempo que a lua caiu, me dando a estonteante sensação de rotação terrestre. Em todos os meus anos no mar, nunca tinha visto nada assim, o sol e a lua estavam de frente um para o outro na face da Terra, comigo de pé diretamente na linha de visão deles. O tempo foi suspenso e os trinta e cinco anos da minha vida de brinquedo se transformaram em uma mancha pictórica, não maior do que os fractais de uma gota transparente caindo no preciso centro do Oceano Atlântico.

A lua afundou no mar, o sol iluminou o horizonte oriental e o Borboleta navegou atravessando um mar calmo e quase morto.

O tempo passou, não saberia precisar quanto, procurei por Hero, mas ele já havia ido, deixando-me com minha perplexidade.

* * * * * *

Duas horas depois, quando meu turno terminou e o Sr. Choy assumiu meu lugar, fui procurar Cian e contar a ela sobre minha experiência. Ela era a única pessoa a bordo que entenderia meus sentimentos de desamparo diante daqueles eventos.

Imagine minha surpresa quando vi Doki em seu lugar habitual, não portava seu violão, mas tinha os cabelos recém-cortados, muito bem penteados e cheios de vitalidade ao lado de um pente marrom e uma tesoura familiar. Com o cabelo selvagem domado, e até a barba grisalha aparada e penteada, ele ficou com uma perfeita apresentação profissional. Mas isso não foi nem metade da minha surpresa, ao seu lado e sob os olhos do professor errante, Cian praticava acordes no violão antigo!

Meu primeiro impulso foi marchar até lá e dizer algo ridiculamente insano, talvez um comentário grosseiro sobre o cabelo impetuoso ou uma observação humorística sobre os sons terrivelmente desajeitados vindos do instrumento. Mas a voz da razão me mandou esperar um momento. Assim o fiz. Antes que qualquer um deles pudesse me notar no caminho que levava ao canto musical, eu me virei abruptamente para a cabine principal para ver se encontraria uma xícara de chá ou uma garrafa com alguém que ouvisse minha lamentável história.

Infelizmente, encontrei o homem das peles, Stanley Dortworthy, bebendo meu chá e conversando com minha irmã rapsódica.

Kaitlin me deu um oi alegre e entrou na cozinha para encontrar um copo vazio.

– Você sabia – disse ela por cima do ombro enquanto infundia uma peneira de folhas de pekoe usadas – que Stanley também está a caminho da Riviera?

Suponho que qualquer homem possa descrever Kaitlin como amável, de certa forma grega, com características delicadamente esculpidas, esse tipo de coisa. Mas um irmão conhece a alma da mulher que vive atrás daqueles olhos azuis angelicais, ele a ama por seu coração e pela confiança que ela deposita nele, não por sua beleza.

– Não – eu disse, sentando em uma cadeira em frente ao Sr. petulancia – Quando “Stanley” decidiu fazer isso? ]

Pronunciei seu nome desdenhosamente, preferindo ignorar o homem do que sofrer com sua total falta de capacidade intelectual para manter uma conversa desequilibrada.

–Há dinero a ser feito lá.

Ele falou comigo de qualquer maneira, como em uma canção, e quase me afogou em seu sorriso torto enquanto mostrava, de forma repugnante, praticamente todas as gengivas e tentava enrugar os olhos incolores.

– Eu acredito – disse a ele – o último búfalo da Riviera foi morto antes do fim da guerra, junto com um dos últimos garimpeiros remanescentes.

O homem riu educadamente, e minha irmã, rindo daquele jeito dela, quando irritada por minhas observações tolas, chacoalhou meu chá diante de mim.

Adicionei açúcar e leite ao líquido morno, praticamente anêmico, e perguntei:

—Mas que diabos aconteceu com você? – não para ela, mas para mim mesmo.

Kaitlin me presenteou com seu encolher de ombros e olhou para Stanley daquele jeito idiota das histórias de verão.

Sangue de Cristo! Essa predestinação está encarnada, que futuro se aproxima grosseiramente diante de mim? Só porque dei uma espiada em um canto minúsculo do universo, o destino vai transformar uma viagem descontraída de Lisboa para a Riviera Francesa, através do sopé dos Pirenéus, em uma trilha interminável de mortos, animais, despidos de suas peles preciosas? Junto com a fervura de pétalas de lótus em pequenas garrafas azuis fedorentas como chinelos de uma velha, justamente STANLEY, o comerciante de peles fedorento e pegajoso? E ainda por cima, ao longo do caminho seremos entretidos pelo barulho de um violão desajustado?

Não, Kaitlin, isso nunca funcionaria. Em seguida, só o que faltava, era minha pequena Rachel anunciar que decidiu permanecer a bordo do Borboleta em Lisboa e navegar em volta do Cabo da Boa Esperança, servindo como marinheira! Afinal, ela tem quase a idade de sua mãe quando fugimos para o mar.

Bem, a única coisa sensata a fazer era encontrar Hero e garantir a mim mesmo que ele não estava tramando um plano desonesto para se tornar o animal de estimação do nosso Sr. Choy e transferir sua lealdade para ele. Ninguém notou minha saída da cozinha,

encontrei Hero deitado de costas sob uma fresta de sol ao lado da porta da casa do leme, através do vidro, Sr. Choy sorria amplamente para mim e curvou-se profundamente enquanto segurava o timão. As duas pernas esquerdas de Hero estavam no ar, movendo-se em uníssono, embora espasmodicamente, deveria estar a perseguir coelhos ou algo do tipo, em seus sonhos. Eu sabia que não deveria acordá-lo. Rachel poderia agarrá-lo e sacudi-lo à vontade que ele não faria nada além de uivar um pouco e depois lamber sua mão com amor, mas se eu tocasse com apenas um dedo do pé que fosse, corria sérios riscos de perder um braço, no mínimo até o cotovelo.

O Sr. Choy ainda estava curvado na minha direção, então eu assenti para aliviá-lo de sua cortesia e deixei os dois entre suas várias fantasias, partindo para dormir abandonado na cabine vazia.

* * * * * *

Quando acordei no início da tarde, a cabine estava ainda preenchida apenas pelo meu mal-estar sombrio, então fui procurar um pouco de café e alguma companhia.

Ao abrir a porta da cabine principal, a cena mais incrível surgiu diante de mim, como se algum fotógrafo de notícias errante tivesse pulado na sala à minha frente e disparado um flash. Kaitlin estatelada com olhos sonhadores, Cian sorrindo e acariciando um cão preto, o tabuleiro de xadrez meio vazio, Rachel segurando seu cachorro estúpido e Stanley Dortworthy com um corte de cabelo entopetado, que o fez virar um garotinho, explicando as complexidades do garfo de cavalo para minha Cian!

—Por que não está tocando violão com a mão livre para seu amigo Doki?

Era o que eu queria dizer a Cian, mas depois de resmungar uma saudação qualquer pelo caminho, tudo o que consegui foi um bocejo de Hero, um meio aceno de Rachel e um olhar apressado de Cian enquanto ela voltava sua atenção para o tabuleiro de xadrez, para não perder nenhum nuance estratégico de nosso mestre enxadrista.

Mexi na cozinha até Kaitlin pegar uma frigideira pesada da minha mão, colocá-la novamente no gancho, derrubar a cafeteira e dizer para eu me calar com um sonoro “Shh?!”

Tudo que eu queria era cafeína e, talvez, uma dose de vingança.

Bebi meu café enquanto me afastava observando as três mulheres da minha vida acariciando Stanley com os olhos, como se ele fosse o último da espécie. Elas eram como três abelhas-rainhas, gordas de ovos não fertilizados, sendo ele o único zangão vivo e disposto. Eu brinquei com o pensamento de dizer a elas que todos os zangões são estéreis e capazes de nada mais do que produzir mel, mas em seu estado atual de espírito, isso provavelmente desencadearia um coro de risadas apaixonadas.

Notei um fato interessante. Stanley, sem seu topete, tinha uma cabeça deveras pontuda.

Dez minutos depois, as lições terminaram, Cian deixou o Sr. Dortworthy, homem das peles e professor de jogos de tabuleiro antigos, no ardor de Rachel e sua mãe, para me acompanhar a algum lugar tranquilo no convés, onde poderíamos conversar em paz.

Saindo no convés, encontramos o ar pesado a nos comprimir. O mar estava perfeitamente liso e o horizonte parecia ter sido pintado com um pincel de aquarela. Exceto por uma pequena nuvem a dez pontos do arco de estibordo, o céu refletia tons acobreados.

Os marinheiros que encontramos em nossa caminhada à popa pareciam nervosos e pensativos, assim como eu estive o dia todo, comunicando-se apenas com um rápido aceno de cabeça ou um grunhido, enquanto se apressavam a seus afazeres. Antes mesmo que chegássemos à popa, o capitão Sinawey transmitiu comandos para levar abaixo qualquer coisa livre no convés. A tripulação já havia começado a arrumar cadeiras e apertar as linhas dos botes salva-vidas. Pedi a Cian para chamar Rachel e Hero e ter certeza de que as outras crianças estavam com seus pais. Ela não questionou minha intenção enquanto voltava mancando para a cabana. Eu estava de vigia, mas fui trabalhar com o resto da tripulação para proteger o navio.

Quando amarrei um adriático, notei nossa tormenta formando um arco, demonstrando um ponto de interrogação nebuloso no mar adiante. Aparentemente, o capitão havia ordenado uma correção de curso para o leste, também enviou o Sr. Choy para dizer a Kaitlin que apagasse o fogo na cozinha e que garantisse todos os potes, panelas e pratos. O jantar seria uma refeição fria, se é que teríamos alguma chance de comer.

* * * * * *

Às quatro da tarde, o céu ficou pálido, com longas caudas de cirros e a maresia voando por todo canto. A pequena nuvem do início da tarde se multiplicara em uma linha de trovões que avançava sobre nós vindo do norte.

O capitão seguiu um curso paralelo à linha de tempestade, na esperança de superá-la a leste. Se ele fosse para sul, sabia que a tempestade logo nos alcançaria e se mantivesse o nosso curso norte, seria o mesmo que convidar um desastre para jantar.

Eu já passara por muitas tempestades no mar, mas poucas foram à noite e confesso que não estava ansioso pelas próximas horas. Reuni minha família em nossos aposentos e disse para ficarem lá, não importa o que acontecesse. O capitão Sinawey me designou ao leme para o turno da noite, então não poderia e estar na cabine com elas, mas pedi que não se preocupassem.

Kaitlin trouxe uma enorme cesta com biscoitos e bacon, junto com água fresca, para a cabine. Ela conhecia a situação e estava bem ciente dos perigos. Cian e Rachel tinham pouco medo de eventos desconhecidos, o que nem sempre era uma coisa boa, mas senti que Kaitlin conseguiria mantê-las dentro e sob controle.

Quando deixei minha família e abri a porta da cabine contra o vento crescente, encontrei Stanley Dortworthy ali, com os nós dos dedos levantados, pronto para bater. Ele disse algo para mim.

– O quê? – gritei.

–Eu vim oferecer minha ajuda! – Ele gritou.

Olhei para ele, imaginando que tipo de assistência ele poderia dar quando percebi que seria melhor tê-lo sob os olhos atentos da minha irmã do que rolando em sua cabine ou correndo pelo convés, torcendo as roupas e chorando por ajuda. Peguei-o pelo bíceps, agradeci, e o empurrei para dentro, batendo a porta com força.

Enquanto corria para a ponte, Doki me parou a estibordo, nos agarramos ao parapeito enquanto ele perguntava sobre Cian e os outros. Disse que estavam seguros na cabine. Ele pareceu satisfeito com a resposta e correu para a escada que levava à casa das máquinas.

Antes de chegar à ponte, pensei em outra coisa e corri de volta para as cabines de passageiros. A porta de dona Lilian estava aberta e ela estava lá dentro, olhando para o mar agitado. Empurrei a porta e percebi o pânico em seus olhos.

– Venha – eu disse, colocando um braço em volta dos ombros dela – Os outros precisarão de você.

Ela me permitiu levá-la para minha cabine. Quando abri a porta, Rachel correu para pegar a mão dela e puxá-la para dentro.

Encontrei o capitão e o Sr. Choy na ponte. O Sr. Choy estava com o timão e o capitão examinava o horizonte com seus binóculos. Sr. Choy olhava nervosamente para mim e recuou do vidro da frente quando outra onda quebrou acima do casco. O Borboleta rolou com o soco, mas logo se endireitou.

Eu assumi o comando para dar um descanso ao Sr. Choy, assim ele poderia tentar pegar um biscoito frio e um pouco de bebida. Montoi veio da sala de rádio e disse ao capitão que havia enviado uma mensagem a Lisboa, informando a posição, o rumo do navio e um relatório sobre o clima.

– Muito bem – disse o capitão – Algum outro navio na área?

– Tris (três) – respondeu o radialista – mas nenhum por perto.

– Deixe-me saber assim que Lisboa enviar novo relatório sobre a tempestade.

– Sim, senhor.

– E talvez – acrescentou o capitão – eles expliquem porquê não nos disseram nada sobre esse golpe que está prestes a cair sobre nós.

Montoi voltou ao seu posto.

* * * * * *

Às 18 horas, caiu o crepúsculo, mas pudemos ver claramente a borda irregular das nuvens carregadas. Às seis e meia, o vento havia se contido em uma brisa que vinha do leste. As ondas ainda não estavam diminuindo de altura ou intensidade, mas sabíamos que elas logo diminuiriam.

– Parece que a superou, capitão – eu disse enquanto olhava da bússola para ele.

Ele assentiu e soltou um grande suspiro de alívio.

Às 6:40, o radialista apareceu com uma folha rasgada de papel amarelo de telégrafo.

– É um SOS, capitão.

– De onde? – O capitão largou a xícara e pegou o pedaço de papel de Montoi.

– Trinta milhas, senhor – ele hesitou – norte a noroeste.

O capitão Sinawey xingou baixinho e depois leu em voz alta:

–A sala de máquinas inundou, três tripulantes perdidos no mar, tomando água à frente das bombas. Helm não está respondendo. – Ele não hesitou em sua decisão – Senhor Saxon, venha para o pórtico.

Para Montoi, ele disse:

–Qual é o nome?

–Ele é o Tecora, de Mombaça, Booth é o nome do capitão.

Girei a roda de leme para a esquerda, todos nós sabíamos que o outro navio estava na borda interna da tempestade.

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