bannerbanner
Crisfal
Crisfal

Полная версия

Настройки чтения
Размер шрифта
Высота строк
Поля

Cristóvão Falcão de Sousa

CRISFAL

I

Antre Sintra, a mui prezada,e serra de Ribatejoque Arrábeda é chamada,perto donde o rio Tejose mete n’água salgada,houve um pastor e pastora,que com tanto amor se amaromcomo males lhe causaromeste bem, que nunca fora,pois foi o que não cuidarom.

II

A ela chamavam Mariae ao pastor Crisfal,ao qual, de dia em dia,o bem se tornou em mal,que ele tam mal merecia.Sendo de pouca idade,não se ver tanto sentiam,que o dia que não se viam,se viam na saudadeo que ambos se queriam.

III

Alg.as horas falavam,andando o gado pascendo,e então se apascentavamos olhos, que, em se vendo,mais famintos lhe ficavam.E com quanto era Maria piquena, tinha cuidadode guardar milhor o gadoo que lhe Crisfal dezia;mas, em fim, foi mal guardado;

IV

Que, depois de assi vivernesta vida e neste amor,depois de alcançado termaior bem pera mor dor,em fim se houve de saberpor Joana, outra pastora,que a Crisfal queria bem;(mas o bem que de tal vemnão ser bem maior bem fora,por não ser mal a ninguém).

V

A qual, logo aquele diaque soube de seus amores,aos parentes de Mariafez certos e sabedoresde tudo quanto sabia.Crisfal não era entãodos bens do mundo abastadotanto como do cuidado;que, por curar da paixão,não curava do seu gado.

VI

E como em a baixezado sangue q e pensamentoé certa esta certeza —cuidar que o mericimentoestá só em ter riqueza —enquerirom que teria[m]e do amor não curarom;em que bem se descontaromriquezas, se faleciam,por males que sobejarom.

VII

Então, descontentes disto,levarom-na a longes terras,esconderom-na entre .as serras,onde o sol não era visto,e a Crisfal deixarom guerras.Além da dor principal,pera mor pena lhe dar,puserom-na em lugarmau para dizer seu mal,mas bom pera o chorar.

VIII

Ali os dias passava em mágoas, da alma saídas,dizer a quem longe estava,e chorava por perdidasas horas que não chorava.Em vale mui solitário esombrio e saudoso,send’o monte temeroso,pera o choro necessário,pera a vida mui danoso,

IX

Dizer o que ele sentia,em que queira, não me atrevo,nem o chorar que fazia;mas as palavras que escrevosão as que ele dezia.Ali sobre .a ribeirade mui alta penedia,donde a água d’alto caía,dizendo desta maneiraestava a noite e o dia:

X

“Os tempos mudam venturabem o sei, pelo passar;mas, por minha gram tristura,nenhuns puderam mudara minha desaventura.Não mudam tempos nem anosao triste a tristeza;antes tenho por certezaque o longo uso dos danosse converte em natureza.

XI

Coitado de mim, cuitado,pois meu mal não se amansacom choro nem com cuidado!Quem diz que o chorar descansaé de ter pouco chorado;que, quando as lágrimas sãopor igual da causa delas,virá descanso por elas;mas como descansar hão,pois que são mais as querelas?

XII

Com tudo, olhos de quemnão vive fazendo al,chorai mais que os de ninguém,que o que é para maior maltenho já para maior bem.Lágrimas, manso e manso,prossigam em seu ofício:que não façam benefício:não servindo de descanso,servirão de sacrefício.

XIII

Minhas lágrimas cansadas,sem descanso nem folgança,a minha triste lembrançavos tem tam aviventadascomo morta a esperança.Correi de toda vontade,que esta vos não faltará.Mas isto como será?Pedi-la-ei à saudade,e a saudade ma dará.

XIV

Todos os contentamentosda minha vida passarom,e em fim não me ficaromsenão descontentamentosque de mim se contentarom.Destes, polo meu pecado,(inda que nunca pequeia e quem amo e amarei),nunca desacompanhadome vejo nem me verei.

XV

Faz-me esta desconfiançaver meu remédio tardar,e já agora esperarnão ousa minha esperança,por me mais não magoar.Se por isto desmereço,dê-se-me a culpa assime seja só com a fim,que há muito que me conheçoaborrecido de mim.

XVI

Meu coração, vós abristescaminho a meus cuidados,pera virem a ser banhadosna água de meus olhos tristes,tristes, mal galardoados.Necessário é que vamosalgum remédio buscarpara se a vida acabar:est’ é [o] bem que dessejamos,est’é [o] nosso dessejar.

XVII

Iremos pela estradapor onde os tristes vão,porque nela, por rezãodeve ser de nós achada,achada consolação.Soir-me-ei ao pensamento,qu’é alto; de ali verei,verei eu se podereiver algum contentamentode quantos perdidos hei.

XVIII

Mas o que poderá verquem já da vista cegou?Porque quem me a mim levoumeu alongado prazernenhum bem ver me deixou.Deixou-me em escuridade,um mal sobre outro sobejo,pelo que triste me vejotam longe de liberdadecomo do bem que dessejo.

XIX

Verei a vida, que em vidabem vista tanto aborrece,aborrece a quem padecetristeza mal merecida,que minha fé mal merece.Levarom-me toda a glória,com quanto bem dessejei,dessejei e alcancei;ficou-me só a memória,por dor, de quanto passei.

XX

Lembrança do bem passado,que não devera passar,esta me há-de matar;dá-me tal dor o cuidado,que se não pode cuidar.Nada, se não for a morte,me dará contentamento:segundo sei do que sento,não sento prazer tão forteque conforte meu tormento.

XXI

Não devo eu mal querera quem me aqui deixou;que ouvido nom possa ser,já me algum bem ficou,que é meu mal poder dizer.Mas, triste, não sei que digo;isto é falar a ersmo:que assaz me foi enemigoquem se vingou de mim mesmocom me só deixar comigo.

XXII

Que me queira consolar,o meu mal não tem confortonem eu lho posso buscar:para o prazer sou mortoe vivo para o pesar.Quanto mal tam desvairadoe todos para dar fim!Tudo me é contrairo, assim:descuido matu meu gado,cuidado matou a mim.

XXIII

Vida de tam longos males,como não cansa de ser!que eu canso já de viver,e o eco destes valescansa de me responder.As ribeiras, em eu vê-las,correm mais do que é seu foro,entrando meu chorar nelas;e pois ajudam meu choro,quero só falar com elas.

XXIV

Companheiras do meu mal,águas que d’alto correis,onde caís desigual,parece que me dizeis:– Porque não choras, Crisfal?Contar-vos quero, amigas,o que esta noute sonhei,com o qual tal dor me dei,que minhas muitas fadigasem mais fadigas dobrei.

XXV

Despois de ontem deixarde vos contar os meus males,fui-me cá baixo geitarno mais baixo destes vales,antre pesar e pesar;onde, despois que aos ventosdescobri minhas paixões,gastadas muitas rezões,mudei os meus pensamentosem minhas contemplações.

XXVI

Contente de descontente,a noute sendo calada,como é certo em quem sente,não ficou cousa passadaque me não fosse presente.Vindo-me à memória dar,quando andava com o gado,ter com Maria sonhado,fez-me o dormir dessejar,de mim pouco dessejado.

XXVII

E crendo que aproveitassepera meu contentamentose eu com ela sonhasse,deu-me logar meu tromentoque algum pouco respousasse.E como cansada estavado que no dia passei,a dormir pouco tardei;e adormecido sonhavao que vos ora direi:

XXVIII

Sonhava, em meu sonhar,onde dormindo estavaali velando estar,quando da parte do margram vento se alevantava,o qual com tal sobressaltochegava onde eu jazia,

Конец ознакомительного фрагмента.

Текст предоставлен ООО «ЛитРес».

Прочитайте эту книгу целиком, купив полную легальную версию на ЛитРес.

Безопасно оплатить книгу можно банковской картой Visa, MasterCard, Maestro, со счета мобильного телефона, с платежного терминала, в салоне МТС или Связной, через PayPal, WebMoney, Яндекс.Деньги, QIWI Кошелек, бонусными картами или другим удобным Вам способом.

Конец ознакомительного фрагмента
Купить и скачать всю книгу